A sabedoria popular constata que a ausência de notícias é uma boa notícia em si mesma. "É boa notícia o que não as tenha", recolhe o Refranero do Centro Virtual Cervantes. Por isso, às vezes é preferível não encontrar na caixa do correio uma carta das Finanças, da polícia municipal ou inclusive das empresas de telecomunicações, que podem ser muito persistentes na hora de assegurar os seus lucros. Por exemplo, na hora de recuperar um router quando o cliente se desvincula. A respeito, Orange é muito explícita no seu site: "Se não devolves os equipamentos terás que pagar em factura uma penalização de 50 € (60,50 € IVA incluído) por cada um deles (ainda que já estejas desvinculado)".
O que acontece é que por vezes esta penalização é alargada aos consumidores que devolveram o router, ou que não o fizeram a tempo simplesmente por não terem sido capazes de o fazer. Nessas vezes, a conexão falha em grande estilo.
Telefonemas durante sete meses
O exemplo de Amadeo Landero ilustra muito bem até onde está disposta a chegar Orange. Este consumidor devia devolver o router numa loja física, mas não o pôde fazer a tempo. "O problema que eu tinha é que precisamente quando era suposto devolvê-los, fiquei doente de Covid e foi-me impossível devolvê-los, e ainda por cima, as lojas Orange estavam cheias até à borda, e eu tinha pouco tempo. Imagina-te, investir o pouco tempo que tens por culpa do trabalho em ir a uma loja a entregar os equipamentos que depois lhes dão igual", narra Landero.
Por este contratimpo forçado, viu-se obrigado a entregá-los mais tarde, mas finalmente fê-lo. "Quiseram-me fazer pagar penalizações, e uma empresa de recuperação de créditos insistiu com telefonemas durante quase sete meses. Queria fazer-me pagar uns 300 euros, apesar de que já tinha entregado os routers", detalha. Uma mera confusão?
"Chamaram à filha de uma vizinha"
Landero bloqueou os telefones desconhecidos, e a empresa de recuperação de créditos passou à ofensiva. "Começaram a procurar e chamaram à filha de uma vizinha de uma casa que tenho na praia. Isso me pareceu surpreendente. Poderiam ter enviado cartas e tal, mas não, fizeram um rastreamento, eu acho que se meteram em minhas redes sociais ou algo assim, porque essa rapariga quase nem a conheço. E foi esta rapariga de 20 anos a que chamou a minha mãe para lhe dizer que tinham perguntado por mim. Imagina-te até que ponto chega a ilegalidade", detalha, assombrado. A empresa, especifica Landero, é a ISGF Jurídicos.
No final conseguiu que lhe tirassem essa dívida porque se constatou que tinha entregado todas os equipamentos, mas "continuaram a tentar que pagasse uma penalização com o argumento de que não tinha entregado o decodificador deaTV, quando lhes entreguei os dois que tinha. Em fim, um caos. Olha que podem solicitar uma recolha pela Seur e pronto", conclui Landero.
A postura da empresa
Este meio perguntou à Orange por estas incidências. A empresa defende que mantém "estritas medidas de controle e padrões de qualidade na relação que mantém com os seus clientes", pelo que o caso de Landero é algo "pontual" e "não corresponde com os processos habituais da companhia".
No entanto, a verdade é que nas redes sociais também há queixas por este motivo. Por exemplo, um utilizador explicou no Twitter que tinha ido a entregar o router a uma loja física, para o que se teve que deslocar uns quilómetros, "e nenhum do computador das duas funcionárias funcionava, pelo que se negaram a recebê-lo. Casualmente há uns anos sucedeu-me o mesmo".
Recolha ao limite
Luzia Mendieta também teve problemas com a Orange. Ela, segundo descreve a este meio, tinha solicitado a retirada do router no mesmo dia da baixa, "tanto por correio electrónico e telefonema como pelas redes sociais", mas desde que o fez até que foi o mensageiro decorreram umas duas semanas. "Esperaram até quase o final com mensagens nas quais diziam que se não devolvia o dispositivo antes de verdadeiro dia, cobrar-se-me-ia", recorda. Como ela já tinha feito a sua parte, estava nas mãos de que a Orange decidisse fazer o seu trabalho ou não.
"No final, sim recolheram-me o router, mas porque conheço estas empresas e tens que estar nas redes sociais para que te façam caso. No caso da Orange tenho uma muito má experiência, até inclusive de assédio telefónico", relata. Por isso, para além de reclamar no atendimento ao cliente, Mendieta conta que "aconselha as pessoas fazê-lo ans redes sociais, já que como imagem da marca lhes dói mais que quando o fazes de maneira privada, quando as suas irregularidades não se vêem refletidas".