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Reviravolta de 180 graus na forma como viajamos de avião: o que são os SAF?

As emissões de gases com efeito de estufa provenientes do transporte aéreo representam cerca de 2-3% das emissões globais.

Ana Carrasco González

Um avião a ser reabastecido SAF / José Manuel Vidal - EFE

O sector da aviação enfrenta um dos maiores desafios da sua história: reduzir drasticamente a sua pegada de carbono sem comprometer a conectividade global.

Durante décadas, os combustíveis fósseis têm sido a pedra angular da indústria aérea, proporcionando a energia necessária para mover aviões de um continente a outro. No entanto, a pressão regulamentar, o avanço tecnológico e a crescente preocupação social pela crise climática têm impulsionado uma mudança sem precedentes na forma em que entendemos a aviação do futuro.

É urgente uma alternativa sustentável

As emissões de gases de efeito estufa do transporte aéreo representam aproximadamente 2-3% das emissões globais, segundo dados da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI).

Vista de um avião a partit do interior / UNSPLASH

Com um crescimento sustentado na procura de voos, a necessidade de alternativas sustentáveis voltou-se urgente. Governos, companhias petroleras e companhias aéreas procuram soluções viáveis para manter operacional uma indústria chave para a economia mundial sem agravar a crise climática.

Uma normativa pioneira

Na Europa, a Comissão Europeia adoptou legislação pioneira para resolver este problema. O Regulamento ReFuelEU relativo à aviação, que entrou em vigor em janeiro deste ano, estabelece objectivos faseados para reduzir a dependência da parafina convencional. 

As companhias petrolíferas são agora obrigadas a incluir uma percentagem mínima de combustíveis sustentáveis no abastecimento dos aviões comerciais. O objetivo a longo prazo é ambicioso: atingir 70% de mistura até 2050, com 35% de combustíveis sintéticos, reduzindo assim drasticamente as emissões líquidas de carbono do sector.

Que são os SAF?

É neste contexto que entram em ação os combustíveis sustentáveis para a aviação, conhecidos como SAF (Sustainable Aviation Fuels). Ao contrário da parafina convencional, os SAF permitem uma redução das emissões entre 70% e 90%, consoante a sua origem e o seu processo de produção. 

Trata-se de combustíveis produzidos a partir de diversas fontes, desde óleos usados até resíduos orgânicos, passando por tecnologias mais avançadas como a captura de CO₂ e a produção sintética com hidrogênio verde.

As companhias aéreas começam a utilizar SAF

Em Espanha, companhias aéreas como Iberia, Vueling, Air Europa e Ryanair começaram a utilizar SAF em cumprimento com o novo regulamento, ainda que reconhecem que a sua disponibilidade continua a ser limitada. Enquanto isso, petrolíferas como Repsol, Moeve (dantes Cepsa) e BP estão a investir na construção de novas fábricas para incrementar a sua produção.

A Repsol, por exemplo, inaugurou na Cartagena a primeira fábrica da Península Ibéria dedicada exclusivamente à produção de biocombustíveis avançados, com uma capacidade de 300.000 toneladas anuais. Moeve, por sua vez, está a desenvolver em Huelva o maior complexo de produção de biocombustíveis de segunda geração do sul da Europa.

O desafio de usar este combustível

No entanto, a expansão da FFS não está isenta de desafios. Um relatório da ONG Ecodes adverte para a dependência de matérias-primas importadas para a produção de biocombustíveis: atualmente, 80% das matérias-primas utilizadas na Europa provêm de outros países, o que pode causar problemas de abastecimento e aumentar os custos de produção. Além disso, alguns biocombustíveis de primeira geração têm sido associados à desflorestação e à perda de biodiversidade, o que tem sido criticado por grupos ambientalistas.

Um avião de uma companhia aérea / FREEPIK - @Racool_studio

Outra preocupação é o risco de fraude na cadeia de abastecimento. A recolha e o processamento de óleos usados e resíduos orgânicos é um processo complexo, e a falta de regulamentação rigorosa pode abrir a porta a práticas desleais, como a certificação de combustíveis não sustentáveis como SAF. Apesar das exigências dos regulamentos europeus, o governo espanhol ainda não implementou sanções efectivas para aqueles que não cumprem os requisitos de mistura.

O potencial dos combustíveis sintéticos

O potencial dos combustíveis sintéticos é também uma aposta fundamental na transição para uma aviação sustentável. Segundo o investigador Marcos Raufast, da ONG Ecodes, o e-querosene pode ser uma solução a longo prazo se for produzido com recurso a energias renováveis e capturar o CO₂ diretamente da atmosfera. Embora esta tecnologia ainda seja cara, representa a única opção verdadeiramente escalável para alcançar a descarbonização total do sector.

Entretanto, o impacto económico da transição é também uma preocupação para as companhias aéreas. A Iberia alertou para o facto de a escassez de oferta e os elevados custos do PAS poderem traduzir-se em tarifas aéreas mais elevadas nos próximos anos. “O sector precisa de incentivos e de maiores investimentos para evitar que a transição se repercuta nos passageiros”, conclui um porta-voz da companhia.