Loading...

Toda a verdade sobre aquela dieta mediterránea que nunca poderás atingir

Poucos elementos têm um halo tão beatífico como o que tem a dieta mediterránea. E, sem que deixe do merecer, a realidade a dia de hoje é que, poblacionalmente, é quase impossível a atingir, apesar de viver num país netamente mediterráneo

O dietista e nutricionista Juan Revenga dá conselhos dietéticos / CG PHOTO SHOTING

O mérito de Ancel Keys, pai putativo do que, curiosamente, depois se converteu em algo que ele nunca chegou a definir, a dieta mediterránea, é digno de louvor. Capitaneou, alguns dizem que com mão férrea -se dizia que tinha um carácter um tanto especial- o popularmente conhecido como Estudo dos sete países. Iniciado no final dos passados anos 50, foi este um trabalho pioneiro e inédito por sua magnitude no terreno da epidemiología nutricional.

Com ele, Keys, estabeleceu uma associação entre certos estilos de vida e a doença cardiovascular. Mais mais especificamente entre a presença de gorduras saturadas na dieta e a mencionada doença. Aquelas populações (dentro dos sete países) que incluíam mais daquele tipo de gordura tinham uma maior incidência da doença cardiovascular, e os que consumiam menos, menor incidência.

O reconhecimento da comunidade científica

Ainda sem publicar aquele trabalho (o Estudo dos sete países se publicou em 1980) Keys foi portada da prestigiosa revista Time em 1961, sendo apodado então como Mr. Cholesterol. Tal era a magnitude dos dados preliminares com o que contava. Neste terreno cabem poucas dúvidas -mais bem nenhuma- de que Keys foi o artífice da declaração de guerra da ciência médica contra o colesterol. Guerra que, como terás comprovado, está ainda bem longe de atingir um armisticio, não digamos já a paz.

Aquele trabalho científico realizado com minuciosidad, gozou de uma fenomenal acolhida na comunidade científica e semeou o germen para que muitos outros pesquisadores se virassem nesta classe de estudos observacionales. Não obstante, não todo foi um caminho de rosas. Sobretudo, pelo aparecimento de algumas vozes críticas que, com o passo do tempo, acusaram a nosso protagonista de ter seleccionado os dados a seu gosto para ratificar sua tese.

O conceito de mercadotecnia da dieta mediterránea

Apesar de que muitos possam questionar -sem provas- este facto, o verdadeiro é que o bom de Ancel Keys jamais falou de forma concreta da expressão "dieta mediterránea". O que sim fez foi publicar dois livros de divulgação geral -que incluíam duas recetarios de cozinha de estilo mediterráneo- junto a sua mulher Margaret. A primeira destas obras viu a luz em 1959 e a segunda em 1975 e ambas tinham um título muito similar, por não dizer idêntico (Eat well and stay well) mas na segunda se introduzia a coletilla The Mediterranean Way, isto é, o estilo mediterráneo.

De modo que, com os dados na mão, não sabemos quem acuñó o termo "dieta mediterránea". Tanto é de modo que, quando se lhe perguntou não faz demasiados anos a Henry Blackburn -mano direita de Keys no Estudo dos sete países- ao respeito da origem desta expressão, este respondeu, literalmente, que, "depois dos livros do casal Keys, foram os experientes em alimentos, os cocineros e a indústria alimentar quem se apressaram em acuñar essa expressão tão elegante e tão chic como o é a dieta mediterránea".

A mãe do cordeiro: a transição nutricional

Ainda passando acima das críticas sesudas ao trabalho de Ancel Keys, e ainda supondo que sejam infundadas, o facto é que os achados de Keys se obtiveram no contexto de umas populações nas que ainda não se tinha realizado a transição nutricional. Esta transição refere às mudanças que experimenta uma sociedade no momento que seu dieta, sendo praticamente de subsistência, está caracterizada pela fome, as deficiências nutricionais e inclusive pelas cartillas de racionamiento, e transita para outro modelo de ampla disponibilidade alimentar e que com o tempo se converte num meio de súper abundância. As doenças relacionadas com ambas dietas são radicalmente diferentes. No primeiro caso, é frequente verdadeiro nível de fome e as doenças carenciales (pela falta de suficientes alimentos nutritivos) são relativamente habituais. Em sentido contrário, uma vez que se realizou essa transição nutricional, as doenças características vinculadas à dieta são aquelas de índole metabólico, tais como obesidad, diabetes, doenças cardiovasculares, etcétera.

O caso, tal e como se pode intuir, é que a, lhe chamemos "dieta mediterránea" se definiu num contexto com um importante ónus físico e uma muito contida quantidade de alimentos. Circunstâncias, ambas, diametralmente opostas às atuais. Assim, por muito que vivamos num país mediterráneo, por muito que comamos pizza ultracongelada e por muito que o façamos em Benidorm, a dieta dos espanhóis tem muito pouco de mediterránea. Quiçá só lhe fique o folclórico e a raigambre geográfica. Pouco mais. De facto, a dieta dos espanhóis de hoje em dia parece-se mais à dos australianos que à daqueles outros espanhóis de faz 40 ou mais anos.

"Dieta mediterránea" como ponto de alavanca comercial

Pese ao dito, em nosso meio somos testemunhas de um grande número de comestibles que fazem gala de sua mediterraneidad com o fim, não te caiba dúvida, de servir como aliciente de venda. Temos refrescos, croquetas, infinidad de snacks salgados, pizzas ultraprocesadas, ginebras, e inclusive -pásmate- penso para cães que explodem em sua publicidade e embalagens que têm uma origem mediterráneo.

Retomando a mesma entrevista sobre Henry Blackburn dantes citada, não é de estranhar que este pesquisador apostille que "em realidade e a dia de hoje a população da bacia mediterránea é a que tem abandonado este estilo de vida, ao mesmo tempo em que se afastou da pobreza implícita que tinha associada em outro tempo".

Por conseguinte, se queres que teu dieta se caracterize pela presença a mais produtos próprios do estilo mediterráneo, te sugiro ter em consideração dois conselhos:

  1. Foge daqueles produtos que aludem a sua origem mediterráneo.

  2. Visita mais o mercado, ou faz compra-a no súper como se estivesses no mercado.

Ah!, e recorda que para te acercar ao verdadeiro estilo de vida mediterráneo, terás de incluir ao mesmo tempo uma verdadeira actividade física de forma quotidiana (seja desportiva ou não). Isto é, terás de mantente fisicamente ativo. Mais do que nos costuma caracterizar.