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Por que vestir de forma sustentável ainda sai demasiado caro

A indústria têxtil é a segunda mais poluente do mundo, mas a utilização de materiais reciclados para produzir roupa ganha força

Javier Roibás

Una tienda de moda y complementos

O sustentável está na moda. E nunca melhor dito. A indústria têxtil é, segundo a ONU, a segunda mais poluente do mundo. É a responsável por 20% do desperdicio total de água a nível global, gera 8% dos gases de efeito de estufa e provoca mais emissões de carbono que todos os voos e envios marítimos internacionais juntos. Nesse contexto, muitas grandes marcas têm posto em marcha diferentes campanhas para reduzir o seu impato no planeta e também se abrem novas marcas que encontram nesta categoria um nicho de mercado interessante. À margem do cuidado do meeio ambiente, uma das principais alavancas que impulsiona essa mudança de mentalidade no setor tem que ver com uma maior procura por parte dos consumidores, a cada vez mais conscientes.

Porém, vestir-se de forma sustentável é, nos dias de hoje, uma prática que não está ao alcance de todas as carteiras. A roupa e os acessórios de moda que se fabricam com técnicas mais respeitosas ou com materiais reciclados são, no geral, demasiado caros. "Há algumas marcas européias de moda sustentável que antes eram pouco conhecidas e que, com o tempo, perderam um pouco a cabeça com os preços", considera em conversa com a Consumidor Global Marcela Payá, dona da loja on-line Lulut Bags, especializada em malas e acessórios confecionados com borracha reciclado.

"Dizer que algo é sustentável, vende"

A principal referência no setor da moda sustentável em Espanha é a Ecoalf. A empresa conseguiu todo o tipo de reconhecimentos pelo seu trabalho ambiental e para confecionar a sua roupa reutiliza diferentes materiais, desde garrafas de plástico até redes de pesca, entre outros. No entanto, se fizer uma revisão ao seu catálogo de produtos, os casacos femininos, por exemplo, não ficam abaixo de 159 euros, enquanto as camisas para homem mais baratas custam quase 90 euros. Para além desta marca, a tendência aos preços elevados nesta categoria do setor têxtil é generalizada.

"A moda sustentável é uma tendência que pouco a pouco converter-se-á numa realidade. Neste momento está num momento de transição, numa espécie de limbo, e há muitas marcas que se estão a juntar por tendência. Dizer que um produto é sustentável vende. Todos os fabricantes chineses o estão a usar nos seus rótulos como marketing, mas muitas vezes, se coçar um pouco, vê que o que há por detrás não é realmente sustentável", assegura por sua vez Ignacio Berges, fundador de Flip & Flip, uma assinatura de Saragoça que faz mochilas com lonas recicladas de camiões e procedentes de empresas locais.

Os processos ainda estão pouco otimizados

As mochilas que se vendem na Flip & Flip também não são baratas, apesar de que se elaboram de forma artesanal e isso incrementa o custo da mão de obra, como reconhece o próprio Berges. Na verdade, alguns dos modelos mais populares da loja chegam a custar quase 170 euros. O empresário aragonés considera que o preço é "o problema principal" da moda sustentável, ainda que também assinala que pouco a pouco se está a abaixar e se fazendo mais acessível. "O preço é um inconveniente nos dias de hoje e é um dos desafios para que este setor comece a ser uma realidade e deixe de ser uma tendência". Mas, qual é o problema?

"Quando começas a fazer coisas novas --como a reutilização--, os processos e os materiais não estão otimizados, ao final todo isso encarece muito o produto por culpa do processo em si", sublinha o empresário. No entanto, opina que quando a tecnologia avançar e mais empresas apostem por este tipo de indústria mais respeitosa, tudo isso provocará que também aumentem os fornecedores de materiais sustentáveis e aumentarão as produções em maior escala. "Acho que, mais cedo ou tarde, o que é sustentável poderá competir em preço com outros produtos de moda que não o são. Além disso, as gerações mais jovens tentam ver para além do que compram. Não só querem que lhes digam que é sustentável, mas também por que o é, de que é feito e de onde vem", refere Berges.

Mais caro, mas também mais duradouro

"A democratização da moda fez com que, em vez de ter uma boa bolsa de couro, pelo mesmo preço possas ter 10, mas que se estragam em pouco tempo", assinala Payá sobre a atual cultura do descartávelde instaurada também na moda. Na mesma linha pronuncia-se Berges, que considera que Espanha adotou como norma que "uma t-shirt valha 10 euros e dure apenas uns meses". Nesse sentido, uma dos principais ativos que as lojas especializadas em produtos têxteis reutilizados jogam é que são mais duradouros.

Na verdade o empresário aragonés considera que os consumidores se confundem com certas reivindicações comerciais. Um exemplo disso é incluir no rótulo que o produto em questão é ecológico, reciclável ou orgânico como sinónimo de que é boa e que respeita o planeta. "Uma mochila de pele, que não é ecológica nem reciclável, pode ser sustentável se dura 20 anos porque o impacto da sua produção no meio ambiente é pequeno em relação ao seu ciclo de vida. Uma feita com materiais reutilizados e mais duradoura, ainda que custe 160 euros, é mais barata que uma de 60 euros que se possa estragar num ano. É menos acessível, mas não mais cara. No general, em Espanha somos curtíssimo prazo", defende.

Fazer roupa com pneus e com ananás

Algumas das tendências ou técnicas que estão a ser exploradas no setor têxtil espanhol para reduzir o seu impacto no meio ambiente são realizadas por materiais que pouco ou nada têm que ver com a moda. Pelo menos a priori. Um deles são os pneus. De facto, Ecoalf e Michelín têm colaborado no desenvolvimento de uma sola de sapato elaborada à base da borracha descartada e que se emprega nuns mocassins da marca. Outro exemplo são os ananases. Na verdade, a espanhola Carmen Hijosa desenvolveu um tecido que se chama Piñatex --uma alternativa à pele natural-- e que utiliza as fibras da folha desta fruta. O sucesso tem sido tal que já há marcas internacionais que o utilizam nalguns dos seus produtos, como Puma, Camper ou Hugo Boss.

À margem disso, o impulso da moda sustentável também se deixa notar em iniciativas de algumas grandes redes como H&M, que desenvolve uma campanha para impulsionar a reciclagem de peças de vestuário e, a partir destas, criar outras novas.