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A guerra da tequila desencadeada pela 'Desperados' respingará outras cervejas com sabor

A Comissão Europeia abriu uma investigação e prevê-se que os seus resultados sejam conhecidos em meados de março

Una mujer sirve tequila en un vaso
Una mujer sirve tequila en un vaso

Guerra aberta entre os produtores mexicanos de tequila e a Heineken devido à cerveja Desperados. O valor diferencial desta e principal motivo da sua fama internacional é a incorporação de um "toque de tequila" que, segundo a empresa holandesa, lhe outorga um "toque picante". No entanto o Conselho Regulador do Tequila (CRT) não gostou disso. Considera que a utilização de um dos produtos mais populares e marca registada do México viola a regulamentação vigente e, além disso, "adultera" a imagem da bebida ao reduzi-la a um mero cheiro adicionado à mistura. Por esse motivo, no início de fevereiro de 2020 o organismo revogou a licença de exportação da Tequilas do Senhor, fornecedora da France Boissons, a filial da Heineken onde se cria o característico aroma para a Desperados. "Essa permissão só foi cancelada para os envios para este cliente --France Boissons-- porque simulavam exportações embaladas de origem para o consumidor final", afirma à Consumidor Global Fernando Cano, representante para Europa do CRT.

Em resposta a esta afronta, em junho do ano passado a cervejeira dos Países Baixos --através da Associação de Cervejeiros da Europa-- denunciou o México ante a Comissão Europeia. O principal argumento e o que Bruxelas está a investigar é se a decisão do CRT representa um obstáculo à importação de tequila do país originario. A onda de choque formou dois blocos muito diferenciados que lutam por interesses opostos. Assim, boa parte das entidades que representam as denominações de origem no Velho Continente apoiam a CRT. Enquanto, a Heineken conta com o apoio da Associação de Cervejeiros da Europa --The Brewers of Europe--. "Estamos preocupados. Não só pelo impacto adverso da restrição atual sobre a cerveja com sabor a tequila líder no mercado, mas também pelo precedente que isto pode abrir para outras cervejas e, potencialmente, sobre outras cervejas com sabor", sublinha a entidade.

Perigo de desvalorização das denominações de origem

Desde o 28 de fevereiro de 2019, a tequila é uma Indicação Geográfica (IG) na União Européia e, ao dia de hoje, é o único produto mexicano protegido por esta figura. De facto, apenas outros dois produtos de fora do continente contam com este selo: o pisco peruano e o rum do Guatemala. "O uso das IG como ingrediente está totalmente regulado", asseguram a este meio desde a Associação Espanhola de Denominações de Origem – Origem Espanha. Embora o gancho comercial da cerveja Desperados seja a popular bebida mexicana, a verdadeiro é que este ingrediente mal é mencionado no rótulo: aroma (75 % tequila), isso é tudo. "Degradá-lo para convertê-lo em aroma é algo inaceitável para uma bebida cujo processo de produção pode durar até 10 anos", queixa-se o CRT.

A Origem Espanha defende com unhas e dentes a decisão do CRT de revogar a licença de comércio exterior ao fornecedor da filial da Heineken. De facto, assinala que Tequilas do Senhor tinha uma autorização para exportar o produto embalado no México, mas não "para revender a granel" na Europa. "Se um operador não respeita as regras a entidade de controle tem a obrigação de recusar a autorização de comercializar o produto e não emitir os certificados", afirma.

25 % de tequila

O que reclama o CRT é que a cerveja da Heineken deixe de utilizar como mensagem publicitária a tequila ou, pelo menos, que esta represente no mínimo 25 % do total do álcool utilizado na popular cerveja. Esta é a percentagem que estipula o regulamento mexicano para que uma bebida possa ser rotulada como elaborada com este ingrediente. "Os consumidores que bebem a Desperados com a expectativa de provar tequila terão uma concepção errónea ao não poder apreciar as suas características essenciais", queixa-se Cano. Além disso, a sua organização também considera que este conflito abre as portas para que qualquer outro produto protegido fique vulnerável e se converta num genérico.

A 13 de agosto de 2020 a Comissão Europeia iniciou uma investigação após denúncia da Associação de Cervejeiros da Europa e prevê-se que os resultados sejam conhidos em meados de março. "Uma falha desfavorável nesta investigação afectaria a primeira Indicação Geográfica de México, debilitaria o sistema de proteção e de controle das IG e também a credibilidade da União Européia neste modelo", afirma Cano. Para além da investigação de Bruxelas, neste momento há dois processos legais abertos pela utilização do aroma a tequila. Ambos arrancaram em 2017 e seguem --com resultados desiguais-- nos tribunais dos Países Baixos e da França. No primeiro caso, o CRT recorreu de uma sentença desfavorável aos seus interesses e no segundo conseguiu uma sentença a seu favor. "Entendemos que França é um país muito respeitoso e com grande tradição em matéria de Denominações de Origem e Indicações Geográficas (…) e na Holanda esperamos que o apelo possa ser favorável", explica Cano.

Vulneración dos acordos bilaterais UE-México

Por sua vez, The Brewers of Europe celebrou a decisão da Comissão Européia de pesquisar em profundidade o caso. "Não se deve restringir a liberdade dos cervejeiros europeus para produzir e comercializar cerveja com sabor a tequila", assegura.

Cuatro cervezas en una mesa / PIXABAY
Quatro cervejas numa mesa / PIXABAY

Além disso, considera que a revogação da licença de exportação da Tequilas do Senhor viola os acordos bilaterais entre a União Européia e o México sobre bebidas espirituosas e também o direito comercial internacional. De facto, Espanha é o terceiro importador mundial de tequila diretamente desde México com números que rondam os 3 milhões de litros ao ano. A associação de cervejeiros também manifesta a sua inquietação por este conflito ir para além do caso concreto da Heineken e pede a cessação da medida adotada pelo CRT.

A Desperados pode desaparecer?

Com os dois eixos alinhados, uma das principais incógnitas em relação a disputa é se a cerveja Desperados pode chegar a deixar de se comercializar, dado que a incorporação de 25 % de tequila na sua composição alcoólica parece pouco provável. "Esta possibilidade decidir-se-á nos tribunais", limita-se a assinalar Origem Espanha a respeito.

Mas, que outras cervejas com tequila poderiam ser afetadas? Nas prateleiras dos principais supermercados este produto é bastante habitual. A Mercadona vende a Especialidades 1897 --que fabrica Brasserie Licorne--, no Carrefour está a Estribos e na Alcampo pode-se encontrar a Burro de Sancho. Em função de como se resolva a guerra do tequila, estes e outros produtos podem estar em apuros.

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