"Quando um escuta 'garantia de 10 anos', pensa que fez uma boa compra. Que a empresa responde. Que há confiança, apoio. Mas a realidade é que a garantia soa muito bem até que a precisas", começa a relatar Daniel Llamas. A 28 de janeiro, Lumes abriu uma incidência com a Decathlon por uma mesa de ping pong que mal tinha resistido ao uso normal. Dois parafusos tinham cedido, comprometendo a estabilidade de uma das tábuas.
Sem dramatismo, mas confiando na solidez dos compromissos adquiridos, o cliente iniciou o procedimento regular, apoiado pela promessa estelar da cadeia de equipamento desportiva; uma garantia de 10 anos. Uma década de cobertura que, em teoria, deveria protegê-lo face a contratempos menores como este. "Não teve um uso especial, nem golpes, nem maltrato. Simplesmente falharam. Pensei que seria uma reparação simples, que não demoraria muito. Ingénuo de mim", sublinha.
A espera: do silêncio à falta de sentido
Enviou as fotos requeridas. Telefonemas, emails… Quinze dias depois, a empresa subcontratada Soltec foi, repetiu a operação fotográfica e comprometeu-se a solicitar as peças. Tudo parecia avançar. Mas o que deveria ter-se resolvido com a eficácia de uma engrenagem suíça converteu-se num labirinto burocrático sem saída.
"Sou eu quem tem que ligar uma e outra vez. Maldita melodia de espera. Nunca, nem uma única vez, contactaram-me proactivamente. Tudo era 'estamos pendentes', 'não temos notícias', 'extraviou-se a incidência'. Uma corrente de desinformação constante", declara Llamas.
Sem solução
Quando finalmente, a 4 de março, lhe foi garantido que a peça chegaria no dia 6, houve uma nova reviravolta. A peça já não está disponível. “No dia 6, dizem-me que já não há peças, que vão substituir a mesa toda”, conta o homem lesado. A única solução agora é a substituição total da mesa, uma opção que poderia ter sido tomada desde o início.
A 13 de março, ficou acordado que o produto seria recolhido. Mas ninguém veio, ninguém telefonou, ninguém explicou nada. E como epílogo desta tragicomédia, “na UCO”, onde também tinha apresentado queixa, “dizem que não encontram o número da minha encomenda nem o incidente, que já lhes dei várias vezes. Estão a brincar a quê? Eu não estou a jogar pingue-pongue”, diz Llamas, que até hoje continua sem solução.
Outras vozes, o mesmo abandono
A história de Daniel Llamas não é exceção. Pelo contrário, faz parte de um conjunto mais vasto de clientes desencantados com a Decathlon, uma marca que, durante anos, foi sinónimo de acessibilidade desportiva, inovação e garantia. Hoje, os seus consumidores narram experiências que parecem saídas de um guião kafkiano.
Vicente Rodrigo, por exemplo, comprou um paddle no site da Decathlon. O produto resultou defeituoso, mas ao ser um produto de MarketPlace, remeteram-no ao vendedor externo. "É da ECD Germany. Derivam-me a eles. Na loja de São Moix, Mallorca, dizem-me que se não li a letra pequena. Quem pensaria que comprando na Decathlon tens que te ler a letra pequena?", reclama.
Garantias que não garantem
Juan José Márquez caiu numa armadilha semelhante. Confiando na mediação da Decathlon, comprou uma máquina Smith no valor de mais de 2.000 euros, procurando proteção ao abrigo da sua garantia. Mas quando os problemas surgiram, a cadeia de lojas não se mostrou interessada. “Escolhi-a através da Decathlon para ter mais garantias. Primeiro erro. A encomenda atrasou-se. Telefono e dizem-me que não podem fazer nada. Mas e se eu lhes pagasse? Lavam as mãos”, desabafa.
Raul O., por seu lado, dá um testemunho desolador sobre o declínio da qualidade dos produtos Decathlon. A sua bicicleta eléctrica, comprada por 1.000 euros, tem sido uma fonte inesgotável de problemas técnicos, culminando na fratura do quadro, que supostamente tem uma “garantia vitalícia”. Mas como ele mudou o espigão do selim, a garantia foi anulada. É-lhe oferecido um quadro novo por 550 euros. “A culpa é minha por ter confiado na marca”, diz.
Que há por trás das garantias da Decathlon?
Decathlon oferece diferentes modalidades de garantia, desde dois anos por danos acidentais até garantias de por vida para quadros de bicicletas B'TWIN. Também permite ampliar coberturas, como no caso de máquinas de fitness.
No entanto, a aplicação destas garantias parece ser o elo mais fraco de uma cadeia que foi anunciada como sólida. Em Espanha, a lei protege o consumidor com uma garantia de 3 anos para os produtos novos. No entanto, a aplicação prática destes direitos torna-se complexa quando a empresa impõe obstáculos, burocracia e, por vezes, a opacidade do seu sistema de vendas externo.
Que pode o consumidor fazer quando a garantia falha?
Quando a garantia oferecida por uma empresa se dilui em desculpas e telefonemas sem resposta, o consumidor não deve resignar-se ao silêncio. Reclamar é um direito, mas também um dever de dignidade. Primeiro, é imprescindível dirigir-se ao vendedor por escrito, com provas em mãos: facturas, fotografias, comunicações. Se a resposta não chega ou resulta insuficiente, o livro de reclamações pode ser um alerta eficaz.
E se isso também não funcionar, há vias mais firmes: a mediação de organizações como a OCU, a Facua, os Gabinetes Municipais de Informação ao Consumidor ou a plataforma de resolução de litígios em linha da União Europeia. Por último, quando todas as mediações falham e a negligência do vendedor acarreta um prejuízo económico significativo, existe ainda a via judicial. Os tribunais civis estão abertos a acções por violação da garantia.