Ansiedade, frustración e sobrecoste notável: no dia a dia a das pessoas com alergias alimentares

Ángel Sánchez Sanz destaca a importância do etiquetado precautorio, que informa da possível presença de alérgenos que não fazem parte da lista de ingredientes de um produto

Una persona con alergias alimentarias revisa la etiqueta de un alimento
Una persona con alergias alimentarias revisa la etiqueta de un alimento

As doenças alérgicas estão entre as seis patologias mais frequentes, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). São problemas acechantes e, em verdadeiro sentido, infravalorados pelo resto da população, que costuma ser alheia à forma na que os alérgicos aprendem, à força, a conviver com sua patologia e a actuar quando sofrem uma reacção grave.

Segundo a Sociedade Espanhola de Alergología e Inmunología Clínica (Seaic), entre o 1% e o 3% da população espanhola sofre algum tipo de alergia alimentar. Ángel Sánchez Sanz é o presidente da Associação Espanhola de Pessoas com Alergia a Alimentos e Látex (Aepnaa), uma entidade que luta por difundir informação de qualidade e que trata de "se fazer escutar com o fim de defender nossos direitos ante a Administração Pública e a empresa privada".

Legislação mais forte

E é que muitas das pessoas que têm alergias alimentares se sentem incomprendidas, não só a olhos da sociedade, sina do próprio Estado. Por tanto, esta entidade, que canaliza iniciativas e está em contacto com médicos, especialistas, profissionais da educação e entidades públicas, se erige como um faro e exige agora uma legislação mais robusta.

"Tenho alergia mas não sou diferente, unicamente meu organismo tem reacções diferentes ao resto das pessoas, ante nutrientes ou substâncias normais", indicam no site da entidade que preside Sánchez Sanz. É já uma aseveración reveladora. Falamos com ele para compreender melhor esta problemática.

--Você tem falado da incomprensión que sentem as pessoas alérgicas, inclusive em seus meios familiares. Crê, pois, que o consumidor espanhol meio não está suficientemente concienciado com respeito ao mundo das alergias?

--Em general, o espanhol médio não está informado sobre as alergias aos alimentos. Alergias há muitas, desde a alergia ao polen que vem dos anos 50 e 60. As alergias alimentares começam no final dos 80 e nos primeiros 90, e a dia de hoje há um grande desconhecimento. Muitas vezes, as alergias associam-se a reacções leves, como pode ser o típico moqueo, lagrimeo de olhos, tosses e estornudos, que são próprias das alergias ao polen, por exemplo. Mas não se costuma ser consciente de que uma reacção a uma alergia alimentar pode ir bem mais lá: pode chegar até um choque anafiláctico e provocar a morte. E, em general, isso se conhece pouco. Falando de alimentos, também há um desconhecimento muito grande sobre a diferença que existe entre intolerância e alergia.

--Poderia desenvolvê-lo?

--A intolerância não tem nada que ver, não é uma reacção do organismo de carácter inmunológico, sina de outro tipo, e os sintomas costumam ser leves e em nenhum caso comprometem a vida. Os celíacos, por exemplo, se tomam gluten vão ter problemas gastrointestinales e em longo prazo podem desenvolver dano intestinal, mas não têm uma reacção aguda. De modo que há muito desconhecimento, certa sensação de que 'por um pouco não passa nada', que não será tanto ou que a pessoa alérgica está a exagerar…

--E isso gera frustración.

--Gera frustración entre as pessoas alérgicas e nas mães e pais de meninos pequenos. Nestes casos, tentas controlar seu meio (também é verdadeiro que às vezes nos equivocamos e podemos, inadvertidamente, dar ao menino o alimento que provoca a reacção alérgica, mas não é o habitual). Mais adiante, quando esse menino ou menina começa a escolarización, tudo muda radicalmente: pode que lhe deixes na guardería e que quiçá ainda não esteja diagnosticado, e na escola infantil está um montão de horas num meio que tu não controlas. A sensação que têm muitos pais e mães que levam a seu menino ao centro escoar é que não se lhes entende, que se lhes percebe como exagerados…

--E depois esses meninos crescem…

--Com a adolescência a situação muda, é um período de mudanças onde os garotos e garotas reafirmam sua personalidade, e às vezes não se aderem à medicación, não levam sua medicación em cima… Pensemos em meninos que têm uma reacção alérgica, uma anafilaxia, e não se administram o autoinyector de adrenalina porque decidem tentar aguentar com a intenção de evitar ir ao hospital para estar em observação quatro ou seis horas.

Em definitiva, o que tens sempre é uma sensação de ansiedade, de que sempre há risco, e ainda que as mortes por um choque anafiláctico são muito escassas, como não podemos predizer a gravidade de uma reacção, tens sempre essa incerteza. Passas por fases de angústia, de raiva, de ira… Não digamos já se teu filho ou filha com alergia sofre bullying no colégio, que por desgraça é uma situação que se produz com mais frequência da que desejaríamos.

--Tem algum dado sobre o impacto económico das alergias alimentares na economia familiar? Isto é, o sobrecoste que enfrentam as famílias com pessoas alérgicas.

--É muito difícil de calcular, porque bem como os celíacos têm um único inimigo que é o gluten, no caso das alergias não há um único foco. Há cerca de 200 alérgenos conhecidos. Em termos gerais, sim podemos dizer que tem um custo, que poder-se-ia quantificar economicamente mas não se fez em Espanha. Para nós fazer a compra é bem mais lento que para uma família normal: temos que ler toda a composição no etiquetado para comprovar que não se tenha mudado a fórmula do alimento que vamos apanhar, seja um tomate fritado ou o que seja. Depois está o custo das consultas médicas, e se as alergias são muito complicadas, em muitas ocasiões o pai ou a mãe do menino toma a decisão de apanhar uma excedencia em seu trabalho, o que logicamente tem um impacto económico para as famílias.

--Não acha que os grandes supermercados têm uma oportunidade para ajudar mais às pessoas alérgicas e projectar uma imagem de maior responsabilidade? Parece um caminho necessário que poder-se-ia empreender sem demasiadas complexidades.

--Não é tão fácil como parece. A aprovação do regulamento 1169/2011 por parte da União Européia supôs um avanço importantíssimo para os consumidores com alergia porque agora se obriga a incluir 14 alérgenos que sejam ingredientes e apareçam de forma destacada no etiquetado, de maneira que possamos os identificar rapidamente. Isto é, que se a fórmula do embutido que estou a comprar tem agora proteína de soja, essa soja deve aparecer realçada.

Mas fica uma questão pendente, que é a do etiquetado precautorio de alérgenos, isto é, a possível presença de alérgenos que não fazem parte da lista de ingredientes e que no processo de produção do alimento podem ter aparecido por ali. Por exemplo, porque há uma linha comum, e o produtor não pode garantir que esse produto não esteja. O que dizia a Comissão Européia no regulamento é que ia desenvolver um regulamento para esse etiquetado precautorio, mas têm passado 14 anos e ainda não se avançou nem um passo neste sentido. De facto, o relatório especial do Tribunal de Contas Europeu, que se publicou no final do ano passado, afeaba precisamente ao CE que dos 11 compromissos de desenvolvimento legislativo que incluíam o regulamento 1169, só se tinham executado quatro, e um deles parcialmente.

--Entendo que isso, para as pessoas alérgicas, resulta muito preocupante…

--Sim, porque ademais os diferentes estudos que se fizeram em países europeus, Estados Unidos, Canadá e Austrália refletem que os consumidores espanhóis figuram entre os mais desconfiados com respeito ao etiquetado precautorio: 'pode conter'. Não te fias, e se pensas que pode conter, existe a possibilidade de que tenha uma reacção. Somos dos mais refractarios ou dos mais indecisos à hora de incorporar estes produtos à cesta de compra-a.

--Que se pode fazer ante esta situação de parálisis legislativa?

--Holanda tem regulado, em 2024, o etiquetado precautorio, estabelecendo uma série de condições que basicamente consistem em estabelecer uma análise de riscos igual que o fazes para a salmonella ou a listeria. A partir daí, estabelece-se um etiquetado precautorio baseado nuns níveis: se encontro uma determinada quantidade de leite por embaixo da ombreira que marca a legislação, não há que etiquetar, mas se sai por em cima sim. São umas ombreiras que indicam que o 95% da população alérgica não reage.

Isso dá ao consumidor uma confiança que até agora não tem, de maneira que para nós seria importante que Espanha desse um passo neste sentido. E não só porque converter-se-ia num dos países mais seguros para os alérgicos, senão porque também estaríamos mandado um sinal à Comissão Européia, já que o mercado único vai começar a experimentar divergências e teriam que reagir.

--A mudança climática provocará um aumento das alergias a nível global. Que valoração faz deste problema?

--Tem uma incidência sobre muitíssimos aspectos de nossa vida dos que quiçá não somos conscientes. O facto de que aumente a temperatura média da atmosfera pode significar que se incrementem os períodos de polinización e que as plantas emitam maior quantidade de polen. Ademais, podem aumentar vetores que dantes não tinham as condições adequadas para desenvolver seus ciclos ecológicos e que agora encontram meios bem mais favoráveis. Um exemplo muito claro é o vírus da febre do Nilo ocidental, que apareceu em Espanha faz 4 ou 5 anos e agora se está a estender. Em Andaluzia cada vez há mais população de risco.

Também vamos enfrentar problemas de desertificación, mudanças em nossa alimentação… A nós também nos preocupam os microplásticos, que actuam como as partículas de diésel: unem-se a outras substâncias e podem produzir um incremento das pessoas alérgicas. A alergia muitas vezes acompanha-se de processos como o asma, de modo que a qualidade do ar também é importantíssimo.