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Ester Barranco, psicóloga: "Quando estamos a funcionar, é mais difícil detectar a ansiedade"

Ester Barranco, psicóloga experiente em ansiedade, explica numa entrevista em ABC como a vida diária pode dificultar a detecção da ansiedade e como aprender à gerir

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A ansiedade converteu-se numa das grandes protagonistas do discurso sobre saúde mental nos últimos anos. Apesar de que se fala mais que nunca sobre ela, muitas pessoas seguem sem saber identificar seus sintomas ou confundem este transtorno com outras emoções quotidianas como o estrés ou o pressiono.

Para a psicóloga Ester Barranco, diretora do centro A Ovelha Negra Psicologia, um dos principais obstáculos é precisamente esse: o ritmo de vida atual impede que nos detenhamos a escutar o que realmente nos ocorre.

De acordo com a entrevista oferecida a Abc.es, Barranco explica que quando estamos inmersos nas tarefas do dia a dia, "funcionando", é bem mais difícil detectar que o que sentimos é ansiedade. Só quando o corpo nos obriga a parar, começamos a suspeitar que algo não vai bem.

Uma ansiedade que se camufla entre a rotina

"Funcionamos como se tivéssemos um leão diante o tempo todo", aponta Barranco. Nesse modo automático de sobrevivência, é fácil que os primeiros sintomas passem desapercibidos. Enquanto algumas pessoas reconhecem a ansiedade pelas taquicardias ou a falta de ar, outras a vivem como dores de barriga, cefaleas, cansaço extremo ou uma sensação generalizada de mal-estar.

O problema é que muitas vezes estes signos não se associam com a ansiedade. "Se a pessoa nunca se propôs que pode ter ansiedade, não o vai detectar como tal", explica a psicóloga. De facto, muitos pacientes chegam a consulta depois de passar por vários médicos sem que ninguém lhes tenha sugerido que poderiam estar a atravessar um episódio ansioso.

Temos mais ansiedade ou só falamos mais dela?

A ansiedade não é nova, mas sim o é a forma na que a abordamos. "Minha avó dizia que estava má dos nervos", comenta Barranco na entrevista. Hoje, ainda que o termo tem-se popularizado, segue sendo difícil assumí-lo como uma realidade própria. Em muitas culturas e contextos, ainda se percebe como uma debilidade, algo que há que ocultar ou evitar.

Este estigma provoca que muitas pessoas ignorem os sintomas ou inclusive os normalicen. A ansiedade, recorda a psicóloga, é universal. Pode-nos afectar a todos em diferentes momentos da vida. A chave está em aprender a identificá-la e, sobretudo, em actuar quando o corpo começa a pedir ajuda.

Educação emocional: a grande matéria pendente

"Para a maioria das pessoas, esta informação é nova", assinala Barranco. Não temos recebido formação em gestão emocional e, por tanto, não sabemos lhe pôr nome ao que sentimos. "Algumas pessoas são capazes de explicar-me o que lhes passa, mas outras não têm nem ideia. Têm vivido tantos anos com ansiedade que acham que é seu estado natural", acrescenta.

Detectar a ansiedade requer consciência e autoconocimiento, algo que não se adquire de forma espontánea. Por isso, ir a um profissional pode marcar a diferença entre viver atrapado num mal-estar constante ou começar a entender que o causa.

Respirar: uma ferramenta singela mas poderosa

Entre as técnicas que se trabalham em consulta, a respiração consciente é uma das mais eficazes. "Quando sentimos ansiedade, respiramos de forma acelerada, com a parte superior do peito, e isso gera hiperventilación", explica Barranco. Esta respiração descontrolada agrava a sensação de afogo e acelera ainda mais o sistema nervoso.

Uma prática singela consiste em inhalar em três segundos, reter o ar uns instantes e exalar lentamente em cinco. Também se pode utilizar um recurso de emergência como respirar dentro da manga da t-shirt.

Ataque de ansiedade ou ataque de pânico: são o mesmo?

Ainda que utilizam-se como sinônimos, não são exactamente iguais. No ataque de ansiedade costuma ter um estímulo claro, enquanto no pânico, o medo surge ante os próprios sintomas de ansiedade. "A pessoa tem medo de que lhe volte a passar, e isso retroalimenta o processo", explica Barranco.

A diferença, por tanto, não está nos sintomas sina no que os desencadeia. Por isso, entender que provoca nossa ansiedade é essencial para poder a abordar com eficácia.

Ansiedade em casal ou em família: como não agravar o problema

Quando alguém próximo sofre ansiedade, a tendência natural é querer ajudar. Mas muitas vezes, as frases mais comuns resultam contraproducentes. "Dizer-lhe a alguém 'te relaxa' ou 'não é para tanto' só consegue que a pessoa se senta ainda pior", adverte a psicóloga.

O mais útil é acompanhar, escutar sem julgamento e evitar invalidar a experiência do outro. Ademais, é importante não assumir a responsabilidade de 'curar' ao outro. "A ansiedade tem-a que gerir quem a sofre. Podemos acompanhar, mas não resolver", recorda Barranco.

Supera-se a ansiedade?

Mais que a superar, a chave está em conviver com ela. A ansiedade não é o inimigo: em doses adequadas, é uma aliada que nos mantém alerta e nos permite render melhor. "O problema é quando se instala como o motor desde o que funcionamos a cada dia", assinala Barranco.

Por isso, mais que a eliminar por completo, o que se procura em terapia é reduzir sua intensidade, compreender sua origem e aprender à gerir de forma saudável. Só assim deixamos de ser escravos do medo e recuperamos o controle sobre nossa vida.