José Antonio Aparicio (Hotelaria Madri): "Há que proteger aos pequenos, aos que fazem bairro"
Este experiente adverte do problemáticas que podem resultar determinadas normativas e assegura que "alguns dos melhores momentos de nossa vida os passámos em torno de uma mesa ou em torno de uma barra"

José Antonio Aparicio tem sido reelegido presidente de Hotelaria Madri por segunda legislatura consecutiva. Liderará a entidade até 2029.
--Que tem que ter, para o presidente de Hotelaria Madri, o bar ideal?
--Diria que uma espécie de cocktail (e nunca melhor dito) de autenticidad, esencia, cercania da propriedade ou da direcção e, o mais importante, que saiba estar aí sempre. Vimo-lo no blecaute, por exemplo: o bar está aí sempre. Tendo em conta estas quatro características, e dado que os bares são a eslabão mais débil (pela dimensão e a estrutura empresarial), preocupa-nos muito o tsunami normativo e regulamentar que estamos a viver, que afecta em especial às PMEs. Sempre nos preocupa muito o pequeno, porque quando bar pequeno desaparece dos bairros e os municípios (pensemos nos de menos de 1.000 habitantes) se perde um catalizador.

--Como acha que se relaciona o carácter madrileno com a grande pujanza de bares e restaurantes?
--Acho que os espanhóis em general e os madrilenos em particular somos de sair, de compartilhar e de não consumir em casa. Somos de estar fora, na rua, e alguns dos melhores momentos de nossa vida os passámos em torno de uma mesa ou em torno de uma barra. Temos ademais uma cidade com uma climatología óptima. Por isso são importantes os terraços: são espaços de socialización ordenados e seguros, e quando os jovens as elegem, podem relacionar num meio seguro e evitar alternativas piores. Por outra parte, penso que o coronavirus nos sacou muito dos interiores. Tem sido uma mudança quase mental, mas já sempre procuramos consumir fora.
--Quanto aos terraços, a Prefeitura tem afirmado que trata de "conseguir o equilíbrio entre o desfrute de um lazer de qualidade no espaço público e o descanso dos vizinhos", enquanto a Federação Regional de Associações Vecinales de Madri pediu o fechamento dos terraços às 23:00 horas. Que valoração faz disto?
--No sector estamos a favor do equilíbrio, e de facto demonstrámo-lo durante muito tempo: os horários reduziram-se quase duas horas desde a pandemia. As autorizações para os terraços estavam em Madri até as 02:00 até faz não tanto tempo e o reduzimos voluntariamente. Fazemos contínuos gestos de conciliação trabalhista, para que nossos empregados possam tentar compatibilizar com sua vida… Mas o que está claro é que se estrangulamos de tal maneira aos empresários de hotelaria com horários que são mais próprios de países nórdicos (sendo conscientes em ocasiões que dessas quatro mesas do terraço depende a viabilidade de uma empresa) conseguiremos que os pequenos, como dizíamos ao princípio, atirem a toalha.

--Que mais envolvimentos teria?
Pensemos que, de se estabelecer esse horário, esses vizinhos que nos reclamam fechar às 23:00 sim ou sim veriam suas ruas mais tristes e menos seguras. De modo que achamos que vão jogar eles mesmos a seus terraços, porque são clientes desses estabelecimentos. Cremos, em definitiva, que conciliar não passa por impor horários que são desmesurados. Nós não queremos isso. É que fechar às 23:00 impede dar os jantares e impede também dar serviço a todas essas pessoas que saem de eventos culturais, como musicais. Corremos um duplo risco: que muitas empresas fechem e despeçam trabalhadores e também que nossas ruas se transformem em espaços mais tristes. Queremos ruas vivas, próprias de nosso carácter latino e de nosso estilo de vida.
--Caberia a possibilidade de que esses horários de fechamento se adaptassem em função do tamanho do estabelecimento? Não é o mesmo a Praça de Olavide que um rincão tranquilo próximo de Ópera.
--O que ocorre é que falamos de um regulamento de protecção acústica. A que se estabeleceu a partir do ano 2015 o fez de uma maneira, consideramos, injusta, porque se fala de distritos quando quiçá poder-se-ia falar de bairros. No distrito Centro, não é o mesmo a parte de Palácio, —tomar uma consumición, por exemplo, face ao Palácio Real no Idoso Rei dos Vinhos, com zero problema de ruídos—, que ta tomar em Lavapiés ou nAs Letras. É um regulamento que não faz distinções e ao final podem pagar justos por pecadores. O regulamento de ruído preocupa-nos muitíssimo porque, se faz-se sem sentido comum, o que se faz é anular zonas inteiras de Madri e as condenar, simplesmente, ao declive.

--Os preços da restauração madrilena subiram em abril um 3,6% com respeito ao mesmo mês de 2024. Acha que seguirão subindo?
--Se comprasse-se o IPC geral com o IPC de hotelaria, é verdade que o sector sobe a ritmo de IPC, mas o faz mais tarde. O que está claro é que, com um regulamento estatal que fala de reduzir a jornada trabalhista (o que suporá um maior custo para os pequenos), com subidas do SMI que, ao que parece, serão contínuas; com todo o problemón que temos de absentismo trabalhista, com toda a pressão fiscal, a subida de matérias primas e os alugueres com pressão enorme em Madri… A conclusão é que podem seguir subindo. E acho que fá-lo-ão porque o cliente não deixa de pedir experiências, qualidade, serviço ou produto. Isso já é um regular em Madri. Nossa preocupação está em questões como o menu do dia ou os cafés da manhã se segue tendo pressão de custos.
--A cena gastronómica madrilena é efervescente, mas O Espanhol publicou faz uns dias uma reportagem no que dizia que a capital registou 100 fechamentos em 2025 e que mais da metade dos restaurantes não duram nem 5 anos. Este artigo falava de que os "alugueres disparados, impostos elevados, subidas salariais e o encarecimiento das matérias primas" tinham reduzido drasticamente as margens de benefício. Preocupa este ritmo de fechamentos?
--Esse artigo põe de manifesto um problema, mas com informação algo parcial. Por suposto, preocupa-nos, especialmente no caso dos pequenos, porque são os que fazem bairro, e a esses, bares, tabernas e cafeterias, há que os proteger entre todos, porque são os mais débis e são os nossos. Mas a realidade é que a estatística reflete que em Madri abrem mais negócios que fecham. De maneira que alguns desses fechamentos são mais bem uma reestruturação: Madri acolhe níveis de investimento muito potentes e, evidentemente, isto faz que se gerem muitas aberturas. E é verdade que as aberturas mau planificadas podem supor fechamentos. Sabemos que muitos fechamentos se devem a um mau planejamento de projecto: planos de negócio que não estão bem trabalhados, que quiçá tenham infravalorado os preços do aluguer… Mas acho que devemos fixar nas aberturas, com dezenas de projectos de jovens empresários abrindo em distritos residenciais ou em municípios.

--Em outubro de 2024, O País falou de que o caro B do bum gastronómico madrileno a compunham "preços disparados, menus clónicos e comidas cronometradas". Neste sentido, a estandardização e a homogeneização que impõem factores como a quinta faixa é uma ameaça?
--Não esqueçamos que estamos a falar de empresas. De modo que quando falamos de homogeneizar e estandarizar, o que há detrás é um esforço por melhorar a produtividade, nem mais nem menos. O que se procura é que o projecto sobreviva financeiramente, e é evidente que existe o risco de que todas as propostas nos pareçam iguais… mas a todos gostaríamos de ter um cocinero nos terminasse de travar um molho em mesa, um sumiller que nos decanta o vinho, um repostero que dá um toque final ao postre… E, provavelmente, que esta experiência durasse duas horas e meia, com tempo ilimitado. Mas isso é incompatível com o preço. Com respeito à quinta faixa há opiniões encontradas, mas há muitas cozinhas que, simplesmente, não têm capacidade para fazer todo o que quereriam. De modo que a quinta faixa, sempre que seja de qualidade (que também há quinta faixa má) contribui valor, e é verdadeiro que simplifica o processo de artesanato gastronómico, por chamar de algum modo. Tendo tudo isto em conta, também há que saber proteger de alguma maneira ao que te oferece uma tortilla vadia ou uma casquería tradicional bem trabalhada, porque normalmente são empresas pequenas. Em definitiva, Madri oferece a possibilidade de ter umas coisas e outras.
--Como se pode fazer o sector mais atraente para os jovens profissionais?
--Acho que temos que contar os casos de sucesso, porque parece que não, mas existem. Aí está, por exemplo, Cañitas Maite, dois jovens de Albacete que criam um emporio gastronómico e se vêm a Madri. Temos que permitir que os jovens vejam que têm uma oportunidade pessoal (que te encha estar todo o dia em contacto com pessoas) e profissional (que possas ter umas retribuições conformes) de crescimento aqui. E, ademais, que tenham incentivos para seguir se formando, como se faz em qualquer sector. Também temos que lhes dar a possibilidade de que conciliem trabalho e vida pessoal, até onde se pode num sector que, como sabemos, opera quando os demais estamos a desfrutar. Trabalha-se fins de semana e feriados, isto é assim e sempre será assim, porque a demanda está onde está e a fazemos todos. Mas o tema profissional é um tema de país. Os jovens, para poder aceder a um emprego, o primeiro que deveriam ter, se queremos que tenha mobilidade, é uma moradia: se a uma pessoa interessa-lhe ir-se a trabalhar a San Sebastián ou a Denia, terá que olhar onde vai residir. Se não há políticas de moradia adequadas, é difícil captar talento.