Otranto, o templo que resgata os vestígios do modernismo

Descobre os tesouros secretos da época mais esplendorosa do bairro do Eixample que descansam neste armazém de Barcelona

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A grande bañera de época, estrategicamente colocada em vertical junto à entrada, animava ao transeúnte a submergir neste armazém de paraísos perdidos, mas alugaram-na a uma popular marca de sapatilhas desportivas para gravar o próximo anúncio de Lamine Yamal. Agora, em seu lugar, se erigen umas imponentes colunas de estilo industrial que provem/provêm de uns baixos da rua Ausiàs March.

El pasillo para acceder a la sala principal / SIMÓN SÁNCHEZ
O corredor para aceder à sala principal rodeado de baldosas hidráulicas / SIMÓN SÁNCHEZ

Avançar pelo corredor, flanqueado por montanhas de baldosas hidráulicas que ascendem até o teto, rodeado de portaladas, rosetones e corrimões deslustradas, refletido nos espelhos de marcos talhados a mão por ebanistas vieneses e banhados em ouro, baixo os lustres de aranha que antanho alumiassem os jantares da alta aristocracia de Barcelona, é como adentrarse na gruta de Alí Babá e descobrir os tesouros secretos da época mais esplendorosa do Eixample.

Espejos bañados en oro y otras reliquias / SIMÓN SÁNCHEZ
Espelhos banhados em ouro e outras reliquias / SIMÓN SÁNCHEZ

Otranto

Assim é Otranto, o templo de passeio Sant Joan que resgata os vestígios do modernismo e os acumula neste imenso local onde dantes estava a sede de Cartonajes Carrión, uma antiga empresa da que se conservam um par de rótulos e as estruturas de madeira, que sobrevoam o teto e em outro tempo serviram para pôr a secar o cartón.

Sandra Ortega, dueña de Otranto / SIMÓN SÁNCHEZ
Sandra Ortega, dona de Otranto / SIMÓN SÁNCHEZ

Escondida num lateral, uma escada desvencijada conduz a um pequeno escritório na que têm seus respectivos escritórios Sandra e Adrián Ortega, os donos, e o telefone, de timbre clássico, não deixa de soar.

Em procura do património perdido

Sua missão é ir ali onde habita o esquecimento. "Os paletas chamam-nos directamente, entramos ao andar e recuperamos desde as portas de madeira, os ventanales e os rosetones, até o mosaico hidráulico", expõe Adrián a este meio.

Puertas antiguas / SIMÓN SÁNCHEZ
Portas antigas / SIMÓN SÁNCHEZ

E Sandra aponta: "Também vem muita gente e nos diz: 'Faz cinco anos que morreu meu avô, o andar está fechado e agora temos decidido o vender e queremos nos desprender de todos estes elementos'. Trabalhamos muito com heranças, e depois está o comprador que quer reformar seu andar e o desmonta inteiro porque não quer nada original".

Recuperar os vestígios do modernismo

Por isso em Otranto se podem encontrar desde portas de filme, como as de Tudo sobre minha mãe (já vendidas), até lustres, antigas bacallaneras (picas de mármol), o pequeno acessório de banho de porcelana, esse puxador único de uma porta, pavimentos do século XIX e outros vestígios.

Una bicicleta y otros objetos procedentes de pisos del Eixample de Barcelona / SIMÓN SÁNCHEZ
Um retrato, uma bicicleta e outros objetos procedentes de andares do Eixample / SIMÓN SÁNCHEZ

"Podes encontrar qualquer coisa. Ao final, recuperamos elementos de arquitectura antiga, sobretudo o que vem sendo um andar modernista do Eixample, e isso inclui o mais inaudito e raro", detalha Adrián.

Mais de 250.000 peças de mosaico hidráulico

O que mais procuram os clientes em Otranto são portas de madeira e solo hidráulico, e as existências são quase infinitas: têm mais de 250.000 peças de mosaico repartidas entre este armazém e uma nave em Gavà.

Un cuadro entre montañas de baldosas hidráulicas / SIMÓN SÁNCHEZ
Um quadro entre montanhas de baldosas hidráulicas / SIMÓN SÁNCHEZ

"O mosaico hidráulico segue-se fabricando, mas não é o mesmo. A este tipo de pavimento fazer bom o passo do tempo, por isso a gente o quer velho, lustrado, com história", recalca Sandra.

O preço marca-o a beleza

O preço regular para este tipo de pavimento do século XIX é de 125 euros mais IVA o metro quadrado ou 5 euros a peça de 15 por 15 centímetros. "Também temos um conjunto inteiro desenhado por Domènech i Montaner e fabricado por Escofet e Fortuny, mas está guardado baixo chave junto a outras peças de nossa colecção pessoal. Isto é como o que guarda quadros de Goya", desvela Adrián.

As portas oscilam entre os 100 e os 2.000 euros. "Hoje temos vendido umas que estão aqui na entrada por 2.000 euros, mas, claro, são umas balconeras bellísimas que vêm de um andar modernista da rua Tuset com Diagonal e são autênticas obras de arte".

De Barcelona a Manhattan

Ao passear entre as reliquias de Otranto, é habitual encontrar-se a curiosos estrangeiros, a homens vestidos de negro com aspecto de arquitecto e a pessoas maiores. "Não temos um cliente tipo", assegura Adrián, quem explica que no outro dia lhes contactou um garoto de Porto Rico que pensava viajar a Barcelona para lhes encarregar várias peças.

Também têm enviado material a Latinoamérica, Califórnia e Manhattan, a Grécia, Singapura e inclusive têm uma fonte de mármol pendente de envio para um casal que vive em Austrália. "A cada peça é única", destaca Sandra. "Conhecemos sua história recente, se vem de um convento ou de um andar de passeio de Gràcia, e, ao final, todo se realoca".