O festival Brava Madri muda seu cartaz 'de tapadillo' e nega os reembolsos
A organização oferecia a possibilidade de contratar, por 5 euros, um seguro que servia como garantia em caso de cancelamento, mas muitos assistentes consideram que a natureza do evento já tem mudado de forma substancial
"É mais que um festival, é nosso espaço seguro, onde podemos ser livres, onde nos encanta ser nós mesmas e onde celebramos uma fantasía de fim de semana em Torrejón de Ardoz (Madri) nos dias 19 e 20 de setembro de 2025". Assim se apresenta em sua página site Bravo Madri, um festival de música que aspira não só a que os assistentes desfrutem dos concertos, sina a contribuir a romper "as barreiras de género" em "os diferentes espaços cheios de fantasía" e "um ambiente sem preconceitos".
Todas estas amigables e coloridas palavras ficam em entredicho ao revisar como, nas últimas semanas, se produziram mudanças importantes no cartaz que a organização do festival não tem comunicado com a suficiente transparência. Ademais, faz ouvidos surdos aos clientes que exigem seu dinheiro de volta.
Mais de 70 euros por entrada
No momento no que os abonos saíram à venda, B. Bielsa comprou duas entradas VIP. Pagou 77 euros pela cada uma delas, e posteriormente, explica a este meio, apanhou uma promoção de recarrega de bebida de 50 euros (+5 euros grátis) para uma das entradas. Ao todo, com as despesas de gestão incluídos, desembolsó 204 euros.

"O investimento no festival vai mais longe se somas os bilhetes de comboio para chegar a Madri e depois o hotel reservado, o que supõe quase uns 300 euros mais", agrega.
Sem Villano Antillano
A primeira decepção chegou quando desapareceu do cartaz Villano Antillano, uma rapera, cantora e compositora puertorriqueña de grande sucesso. A ela seguiram Pixie Lott, que "acho que é por gravidez", precisa Bielsa, e Aquaria, além da baixa de Abril Zamora. Bielsa recalca que não tem tido comunicações oficiais, senão especulações. O innegable é que o cartaz tem mudado.
"Inteirei-me pela gente e porque em julho subiram um cartaz oficial a Instagram e essas pessoas já não saíam. Em mudança, sai no cartaz Aquaria, que tem cancelado sua participação recentemente", explica.
Brava Madri muda seu cartaz 'de tapadillo'
Em redes, o estupor combina-se com o enfado. "Têm cancelado dois artistas do Brava (uma cabeça de cartaz) e têm feito como se nada. Aqui não se conta e não tem passado nada", protesta um internauta em X. "O Brava Madri bem calladito como ratas quando nem Villano Antillano, nem Aquaria, nem Pixie Lott vão. Têm cancelado por razões óbvias e eles, enquanto, em silêncio o deixando passar. São uma vergonha", coincide outro.

A obviedad destas razões reside na identidade e a propriedade dos organizadores do festival. Tal e como publicou em maio O Salto, a organizadora de Brava Madri, que está também por trás do Sónar, o Arenal Sound ou o Vinha Rock, foi adquirida em 2024 pelo fundo de investimento KKR, que tem sido acusado de financiar a ocupação ilegal israelita em Gaza.
Repete-se o sucedido com o FIB
Parece tratar-se de algo muito similar ao sucedido em julho com o Festival Internacional de Benicàssim (FIB).
Tal e como publicou então Ana Carrasco, oito importantes artistas (Residente, Judeline, Califato 3/4, A Fúmiga, A Elite, Samantha Hudson, Mushkaa e Camelos) cancelaram sua participação na última edição do festival pelos vínculos de Superstruct Entertainment, empresa matriz, com o fundo KKR, que investe "em empresas israelitas vinculadas a tecnologia militar, vigilância, espionagem e projectos imobiliários em assentamentos ilegais em territórios palestinianos ocupados".

Negam os reembolsos
Nesse caso, o FIB negou-se a devolver o dinheiro aos assistentes que assim o reclamaram. E, por enquanto, parece que o Brava fará o mesmo. Decepcionado, o 28 de agosto, Bielsa solicitou formalmente a devolução de seu dinheiro por correio eletrónico. A dia de hoje não tem obtido resposta. "Escrevi-lhes por redes sociais e não me contestam, me têm silenciado porque meus comentários não lhes aparecem a meus amigos", detalha.
O verdadeiro é que nas condições de compra (ao menos nas que se podem consultar na actualidade), a organização de Brava deixa claro que não se permitem devoluções de entradas previamente adquiridas on-line.
Condições
"A entrada não pode ser objeto de devolução, nem mudança, salvo cancelamento total do evento, ou modificação da data de celebração do mesmo. Se a cancelamento é total a Promotora devolverá o custo da entrada nas condições que publicar-se-ão por este mesmo meio. Não devolver-se-á o preço total das entradas se a cancelamento se produziu uma vez começado o Festival por causas alheias à promotora", expõem.

Para os assistentes existia, isso sim, a possibilidade de contratar um seguro por 5 euros que outorgava garantia de devolução. "Esse seguro cobre umas determinadas situações, não o adquirimos porque não o consideramos necessário, íamos ir com o cartaz que se confirmou inicialmente. Agora têm modificado substancialmente os artistas, e acho que temos direito a reclamar a devolução ao não actuar os artistas pelos que compramos o abono", raciocina Bielsa.
"Acima da legislação"
Não é o único que pensa assim. "Segundo Enterticket, a organização de Brava Madri não admite devoluções salvo cancelamento total do evento. Desde quando uma decisão da organização está acima da legislação vigente?", pergunta-se um afectado em X.

Ao respeito, depois da cascata de cancelamentos do FIB, Facua recordou que os utentes que tivessem entradas tinham direito a reclamar a devolução do dinheiro depois da modificação de seu cartaz pela negativa de vários grupos e artistas a participar.
Variação do espectáculo
A entidade citava o Real Decreto 2816/1982, de 27 de agosto, pelo que se aprova o Regulamento Geral de Polícia de Espectáculos Públicos e Actividades Recreativas, que recolhe em seu artigo 58 como direito dos utentes "a devolução do custo das localidades adquiridas, caso de não se achar conforme com a variação do espectáculo ou actividade ou de suas condições ou requisitos, disposta pela empresa".
Este meio tem contactado com Brava Madri e com The Music Republic para perguntar por estes factos e conhecer se consideram que se negar a oferecer uma devolução é uma prática ética, mas, ao termo desta reportagem, não tem obtido resposta.