"Ligaram à filha de uma vizinha da praia": a insólita 'perseguição' da Orange por um 'router'

A Orange cobra mais de 60 euros aos seus clientes que não devolvem o router, ao mesmo tempo que as empresas de cobrança com as quais trabalha agem no limite da legalidade

Uma pessoa fala ao telefone com o seu banco devido a uma fraude/ FREEPIK - gpointstudio
Uma pessoa fala ao telefone com o seu banco devido a uma fraude/ FREEPIK - gpointstudio

A sabedoria popular constata que a ausência de notícias é uma boa notícia em si mesma. "É boa notícia o que não as tenha", diz o provérbio do Centro Virtual Cervantes. Por isso, às vezes é preferível não encontrar na caixa de correio uma carta das Finanças, da polícia municipal ou inclusive das empresas de telecomunicações, que podem ser muito persistentes quando se trata de garantir os seus lucros. Por exemplo, na hora de recuperar um router quando o cliente se desvincula.

A respeito, Orange é muito explícita no seu site: "Se não devolves os equipamentos terás que pagar na factura uma penalização de 50€ (60,50 € IVA incluído) por cada um deles (ainda que já estejas desvinculado)". O que acontece é que, por vezes, esta penalização é alargada aos consumidores que devolveram o router, ou que não o fizeram atempadamente, simplesmente porque não o puderam fazer. Nessas ocasiões, a ligação falha redondamente.

Telefonemas durante sete meses

O exemplo de Amadeo Landero ilustra muito bem até onde está disposta a chegar Orange. Este consumidor devia devolver o router numa loja física, mas não o pôde fazer a tempo. "O problema que tive é que justamente no momento que tinha que os entregar apanhwi Covid e foi-me impossível entregá-los, ainda por cima as vezes que ia as lojas da Orange estavam cheias até à borda, e eu tinha pouco tempo. Imagina-te, investir o pouco tempo que tens por culpa do trabalho em ir a uma loja a entregar os gadgets que não lhes interessam", narra Landero.

Un router
Um router / UNSPLASH

Devido a este contratempo forçado, viu-se obrigado a entregá-los mais tarde, mas acabou por o fazer. Queriam obrigar-me a pagar multas e uma empresa de cobrança de dívidas telefonou-me durante quase sete meses para me obrigar a pagar 300 euros, apesar de eu já ter entregue os routers", conta. Queriam obrigar-me a pagar cerca de 300 euros, apesar de eu já ter entregue os routers", conta. Uma mera confusão? 

"Ligaram à filha de uma vizinha"

Landero bloqueou os telefones desconhecidos e a empresa de cobrança de dívidas passou à ofensiva. "Começaram a procurar e ligaram para a filha da filha de um vizinho de uma casa que tenho na praia. Achei isso surpreendente. Podiam ter-me enviado cartas, etc., mas não, foram atrás, acho que entraram nas minhas redes sociais ou assim, porque eu mal conheço essa rapariga. E foi essa rapariga de 20 anos que telefonou à minha mãe para lhe dizer que tinham perguntado por mim. Podem imaginar como isto é ilegal", diz, estupefacto. A empresa, especifica Landero, é a ISGF Jurídicos.

Acabou por conseguir que a dívida fosse anulada, porque ficou provado que tinha entregue todo o equipamento, mas "continuaram a tentar que eu pagasse uma multa porque não tinha entregue o descodificador de televisão, quando já tinha entregue os dois que tinha. Em suma, foi um caos. Olha, eles podem pedir uma recolha à Seur e pronto", conclui Landero.

Sede de la empresa Orange en el Parque Empresarial La Finca de Pozuelo de Alarcón, en Madrid
Sede da empresa Orange no Parque Empresarial La Finca de Pozuelo de Alarcón, em Madrid / EUROPA PRESS - RICARDO LOIRO

A postura da empresa

Este meio perguntou á Orange por estas incidências. A empresa defende que mantém "estritas medidas de controle e padrões de qualidade na relação que mantém com os seus clientes", pelo que o caso de Landero é algo "pontual" e "não se corresponde com os processos habituais da companhia".

Não obstante, a verdade é que nas redes sociais também há queixas por este motivo. Por exemplo, um utilizador explicou no Twitter que tinha ido entregar o router a uma loja física, para o qual teve que se deslocar uns quilómetros, "e a nenhuma das duas funcionárias lhe funcionava o computador, pelo que se negaram a recebê-lo. Casualmente há uns anos sucedeu-me o mesmo".

Recolha no limite

Luzia Mendieta também teve problemas com a Orange. Ela, segundo descreve a este meio, tinha solicitado a retirada do router no mesmo dia do cancelamento, "tanto por correio eletrónico e telefonema como pelas redes sociais", mas desde que o fez até que foi o mensageiro decorreram umas duas semanas. "Esperaram até quase o final com mensagens nos quais diziam que se não devolvia o dispositivo antes de verdadeiro dia, cobrar-se-me-ia", recorda. Como ela já tinha feito a sua parte, estava nas mãos de que a Orange decidisse fazer o seu trabalho ou não.

Un 'router'
Um 'router' / UNSPLASH

"No final, sim recolheram o router, mas porque conheço estas empresas e tens que estar nas redes sociais para que te façam caso. No caso da Orange tenho uma muito má experiência, até inclusive de assédio telefónico", relata. Por isso, para além de reclamar no apoio ao cliente, Mendieta conta que "animaria as pessoas a fazê-lo nas redes sociais, já que como imagem da marca lhes dói mais que quando o fazes de maneira privada, quando as suas irregularidades não se vêem refletidas".