A desinformación de Renfe por telefone, e-mail e em pessoa

Oito comboios entre a capital e o sul têm sofrido novas incidências, enquanto a companhia ferroviária volta a deixar aos passageiros atrapados no limbo

Pasajeros esperando en la estación de Santa Justa, Sevilla, mientras Renfe no ofrece ninguna informa
Pasajeros esperando en la estación de Santa Justa, Sevilla, mientras Renfe no ofrece ninguna informa

Domingo, 11 de maio. Final da Feira de Abril. Milhares de viajantes se agolpan na estação de Santa Justa, em Sevilla, arrastando malas, flores vermelhas ainda ancoradas no cabelo e a resaca das madrugadas flamencas.

Andaluces e convidados de fora preparavam-se para o regresso, quando, mal uma semana após o caos causado pelo roubo de cabo na mesma linha, os problemas na conexão ferroviária entre o sul e a capital voltavam a se repetir. Desta vez, sem sabotagens. E, o que é mais grave, sem explicações por parte de Renfe.

O começo da desinformación

O que devia ser uma viagem singela, um Ave de Sevilla a Madri e depois um enlace a Barcelona, se converteu numa travesía sem coordenadas. Uma "incidência técnica", segundo a escueta versão oficial, deteve às 12:30 horas um comboio entre A Sagra e Mora (Toledo), afectando a outros sete serviços de longa distância.

Pasajeros en la estación de Santa Justa, Sevilla ANA CARRASCO
Passageiros na estación de Santa Justa, Sevilla / ANA CARRASCO

O comboio que devia tomar desde Santa Justa tinha saída prevista às 16:31. Finalmente, partiu para perto de as 18:30. Durante essas horas na estação, não se escutou nem um sozinho aviso por megafonía. Também não encontramos pessoal de Renfe visível que oferecesse informação. Só se acumulavam corpos e perguntas. Chegaremos a tempo a Madri para apanhar o comboio a Barcelona das 20:05? Terá outra opção se não o conseguimos?

O primeiro trajecto

Depois de duas horas de atraso, por fim, pudemos sentar em nosso assento, em direcção a Madri. No vagão, não teve nenhum comunicado. Nenhuma voz. Só um revisor –pouco amável e desbordado– que respondia com monosílabos a quem se animavam a interceptar no corredor. Muitos passageiros não sabiam que estava a ocorrer. Viajavam sem saber se chegariam, se perderiam suas conexões, se Renfe fá-se-ia cargo de algo. Outros, tentamos chamar a atenção ao cliente. A resposta foi tão desconcertante como vazia.

"O que põe no site é a única informação que tenho", me disse a operadora, sem margem para mais. Insisti. Perguntei se realocar-nos-iam em outro comboio, se cobririam as despesas em caso de ter que pernoctar em Madri. A resposta foi um bucle. "Na estação informar-lhe-ão". Não teve mais. Nem consolo, nem certezas.

"Graças por confiar em nossa experiência"

Meu casal optou pelo correio eletrónico, quiçá confiando numa atenção menos automática. A resposta que recebemos foi um parágrafo de regulamento desprovisto de humanidade: "Ao não ter mais de 60 minutos entre a chegada de seu comboio e a saída do seguinte, não existe garantia de enlace. Terão que realizar o segundo trajecto por seus próprios meios". E depois, uma sentença que parecia escrita com sarcasmo involuntario: "Graças por confiar em nossa experiência".

A nosso lado, um grupo de garotas galegas também chamava, com o móvel em alto, a atenção ao cliente. "Como!? Temos que passar a noite em Madri? Amanhã trabalhamos! Temos que chegar a Ourense!", exclamava uma delas, enquanto os demais passageiros, em silêncio, a escutávamos com atenção, esperando não ser os seguintes em ficar atrapados no limbo ferroviário de Renfe.

A chegada a Atocha

A chegada a Atocha foi como o desembarco de uma expedição extraviada. Dirigiram-nos a uma zona onde se concentravam dezenas de passageiros com bilhetes de enlace. Um trabalhador de Renfe, rodeado por uma multidão nervosa, organizou os grupos como se pastoreara ganhado. "Os que vão ao noroeste por aqui. Os que vão ao este, por ali", gritava aos passageiros.

Pouco depois, ouviu-se uma ordem mal susurrada entre empregados: "Corre, leva a este grupo dentro". Um rumor percorria a plataforma, os que se dirigiam a Galiza teriam que passar a noite em Madri. Nós, com destino a Barcelona, ficamos numa espécie de limbo organizativo na via 3, sem saber se subir-nos-iam a algum comboio ou simplesmente deixar-nos-iam ali até a último Ave da noite.

Ninguém explicava nada

Finalmente, apareceu uma empregada que só atendia individualmente a quem a abordavam. Ninguém ofereceu uma explicação coletiva. Não se deu uma parte oficial, nem uma listagem, nem um plano. Fomos embarcados num comboio que vinha de Málaga com atraso. Ao subir, escapou-se-nos um unísono suspiro.

Varias personas sentadas en el suelo esperan en la estación de Atocha Almudena Grandes / FERNANDO SÁNCHEZ - EP
Várias pessoas sentadas no solo esperam na estação de Atocha Almudena Grandes / FERNANDO SÁNCHEZ - EP

Com o comboio em marcha e o estômago vazio, meu casal e eu vamos à cafeteria. O empregado atendeu-nos com uma expressão que dizia mais que suas palavras. "Levo trabalhando desde as dez da manhã. Não sê que tem passado. Meteram-me aqui sem explicar-me nada. Tudo isto é muito raro ultimamente", confessava. Era a primeira voz honesta do dia. Uma confesión desde dentro de um sistema onde ninguém parece saber nada, nem os passageiros, nem quem trabalham sobre as vias, nem quem devem as gerir.

O abandono de Renfe

A confiança numa operadora pública como Renfe se baseia, para além da pontualidade, na capacidade de cuidar ao passageiro quando algo falha. Não se escutou nem uma desculpa. Não é suficiente com ocultar por trás da letra pequena dos bilhetes. A gestão de uma crise, por pequena que seja, começa pela comunicação, pela transparência e pelo respeito a quem, ao final, paga o bilhete.

Chegamos a Barcelona passadas a uma da madrugada, exhaustos e com a impressão de ter vivido não um atraso, sina uma disfunción sistémica. No domingo 11 de maio não foi uma excepção. Foi uma mostra. Uma mostra como numa rede ferroviária que aspira a ligar um país, a conexão mais importante, a humana, parece se ter descarrilado.