O consumo de cerveja se desploma em Espanha

O sector encadeia seu segundo ano de quedas, com um descenso de 0,2% em 2024, pese ao crescimento económico e ao aumento do emprego

Vaso de cerveza   EDUARDO PARRA   EP
Vaso de cerveza EDUARDO PARRA EP

O consumo de cerveja em Espanha tem registado em 2024 seu segundo ano consecutivo de quedas, algo que não ocorria desde a crise financeira de 2008. Segundo o relatório Socioeconómico do Sector da Cerveja em Espanha 2024, elaborado por Cerveceros de Espanha em colaboração com o Ministério de Agricultura, Pesca e Alimentação, as vendas baixaram um 0,2%, até os 38,6 milhões de hectolitros.

Este retrocesso produz-se num contexto paradójico. A diferença de 2008, quando a recessão e o desemprego explicavam o frenazo do consumo, hoje a economia cresce, o emprego se recupera e as famílias dispõem de maior renda. Por isso, o sector considera que poderia se estar a produzir uma mudança estrutural nos hábitos de consumo.

As possíveis causas

A inflação, a incerteza internacional e um maior planejamento da despesa familiar citam-se entre as causas desta queda. Jacobo Olalla Marañón, diretor geral de Cerveceros de Espanha, qualifica a situação como "preocupante", e assinala especialmente a forte baixada registada no último trimestre do ano, sobretudo na zona centro do país.

Varias personas brindan con cerveza / UNSPLASH
Várias pessoas brindam com cerveja / UNSPLASH

Ademais, o consumo per capita tem-se desplomado um 4,9%, situando-se nos 52,8 litros por pessoa. A tendência afecta a todos os grupos de idade, com especial incidência nos menores de 50 anos, quem apresentam um padrão de consumo "mais contido e moderado".

Hotelaria, a mais afectada

A queda tem sido especialmente notável no canal de hotelaria, que tem sofrido um descenso de 2% em vendas (até os 19,2 milhões de hectolitros). Em contraste, as vendas em alimentação cresceram um 1%, o que poderia indicar um translado do consumo desde bares e restaurantes para o âmbito doméstico.

Pese à conjuntura adversa, Espanha mantém sua posição como segundo maior produtor de cerveja da União Européia, com mais de 41 milhões de hectolitros elaborados em 2024, por trás de Alemanha e por adiante de países como Polónia ou Reino Unido. O sector cervecero representa o 1,3% do PIB espanhol e o 2,6% da arrecadação fiscal, contribuindo 6.500 milhões de euros ao Estado e gerando mais de 540.000 empregos. Também é responsável por 5.200 milhões em despesa turística, e mantém uma forte vinculação com a hotelaria, representando até um 25% de sua facturação.

O golpe às cervejas 'craft' e à exportação

Outro dos sectores que tem acusado o golpe tem sido o das cervejas artesanais. Em 2024, o número de cerveceras 'craft' caiu um 2%, acumulando uma redução de 35% desde 2019. "A pandemia esmagou-lhes. Muitas têm desaparecido, ainda que as que resistem estão a crescer", tem afirmado Olalla.

As exportações também não escapam à tendência negativa. Espanha exportou 3,37 milhões de hectolitros, um 19% menos que em 2023, quando se atingiram os 4,17 milhões.

A cerveja SEM vontade terreno

Em frente à queda geral do consumo, a cerveja sem álcool continua sua ascensão. Espanha consolida-se como líder europeu, concentrando o 25% do consumo desta variedade na União Européia. Em 2024, suas vendas cresceram um 4% e já representam o 14% do total consumido, e até o 16% no canal lar.

Esta tendência está especialmente liderada pela Geração Z, que opta a cada vez mais por produtos com menor graduación alcohólica. "Consumimos mais cerveja sem álcool que toda Latinoamérica junta", destacou Olalla, sublinhando que esta opção já não se percebe como uma imposição, sina como uma eleição consciente.

Um sector ancorado ao território

Mais de 90% das matérias primas utilizadas na elaboração de cerveja são de origem nacional, o que reforça o papel do sector como aliado estratégico do meio rural. Actualmente, 2,3 milhões de hectares destinam-se ao cultivo de ingredientes finque, como o lúpulo, cujo 91% se cultiva em Castilla e León.

Dos copas con cerveza Pilsner / FREEPIK
Duas copas com cerveja Pilsner / FREEPIK

Desde o Ministério de Agricultura, Ana Rodríguez tem sublinhado a relevância do sector cervecero como "motor do desenvolvimento rural" e seu compromisso com a luta contra a despoblación, a sustentabilidade e o impulso do produto local.

Bares e cultura cervecera

Apesar das dificuldades, o sector mantém uma estreita colaboração com a hotelaria, na que tem investido 600 milhões de euros para melhorar a experiência do cliente. Emilio Galego, secretário geral de Hotelaria de Espanha, recordou que "quando dizemos cerveja, dizemos bares de bairro, terraços e comunidade".

Ademais, destacou o auge da cultura cervecera em Espanha, com uma oferta a cada vez mais variada e exigente. "A cerveja está a qualificar-se como proposta de valor em nossos estabelecimentos", concluiu. Ainda que o consumo cai, a importância social, económica e cultural da cerveja em Espanha segue vigente. O desafio agora é adaptar a um consumidor mais consciente, moderado e exigente.