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AllZone, arguida de fraude em massa, poderia reter dinheiro de clientes para manter-se a flutuar

A empresa acumula mais de 1.197 queixas por não entrega de produtos ou reembolsos, enquanto a OCU denuncia uma burla organizada.

Ana Carrasco González

Pablo Moscoloni, CEO da AllZone / LINKEDIN - CG

Milhares de consumidores pagaram, mas não receberam nada. Nem o produto que adquiriram nem o reembolso prometido. A loja online AllZone converteu-se no epicentro de um crescente mal-estar cidadão. A situação escalou a tal extremo que a Organização de Consumidores e Utilizadores (OCU) já fala de fraude em massa e apresentou uma denúncia formal junto das autoridades de Consumo, acusando a empresa de uma possível fraude organizada, depois de ter acumulado –só no que vai de 2025– mais de 1.197 reclamações.

Enquanto, a empresa –especializada em tecnologia, produtos para o lar, roupa e artigos de uso quotidiano– guarda silêncio. Bloqueou os comentários nas suas redes sociais e recusa responder aos meios. Optou por isolar-se, justo quando mais se lhe exige uma explicação. Que está a ocorrer realmente depois desta plataforma? Está a utilizar os fundos dos seus clientes para manter-se a flutuar sem enviar os artigos adquiridos nem tramitar as devoluções solicitadas?

A onda de reclamações

O primeiro sinal de alarme chegou em forma de mensagens isoladas nas redes sociais. Depois, como uma mancha de óleo, multiplicaram-se as queixas. Hoje, os relatos de clientes indignados são inúmeros. Como o de Marcos España, que fez um pedido de um telemóvel há mais de seis meses. Ante a falta de entrega, cancelou-o, mas o dinheiro não regressou à sua conta: "Puseram-mo na conta de cliente, então fiz outro pedido com esse dinheiro. Faz já três meses e meio e também não…", escreveu a 17 de março.

A página da AllZone / CAPTURA

Nesse mesmo dia, Marcos Morilla elevava o tom. "Estou à espera há mais de dois meses. Só dais longas e não atendeis nem para me enviar o meu pedido nem para me devolver os meus 923,12 euros. Sabeis contar nos dias ou só os euros que vos ingressamos? Isso se chama fraude", arremete contra a própria rede na sua conta pessoal de X. Cabe destacar que, a política interna de Allzone estabelece que o reembolso deve realizar-se entre 10 e 20 dias úteis após o cancelamento.

Um mesmo padrão

São depoimentos repetidos com nuances, mas com um padrão claro: pedidos que não chegam, reembolsos que não se processam e uma apoio ao cliente inexistente. As experiências multiplicam-se. Jonatan García realizou um pedido a 31 de dezembro de 2024. A 19 de março, ainda não tinha recebido o produto (um iPhone), e depois de tentar anular o pedido e exigir a devolução do seu dinheiro sem sucesso, denunciou o caso à polícia e solicitou a intervenção do seu banco para recuperar os fundos.

“Já passaram dias desde o cancelamento. Apresentei uma queixa e falei com o meu banco para obter o meu dinheiro de volta”, postou García. As histórias de Jaume Moya e José Manuel Sánchez, ambos clientes da AllZone, acrescentam novos capítulos à mesma história de atrasos de mais de dois meses, promessas de reembolso não cumpridas e a impotência de enfrentar uma empresa que, aos olhos dos seus clientes, parece ter desaparecido atrás do ecrã.

A OCU denúncia que é mais que um atraso

Com o aumento das críticas, a AllZone optou por uma estratégia de encerramento, bloqueando a opção de comentários nas suas contas oficiais. O crescimento exponencial das queixas parece ter ultrapassado a capacidade de resposta da empresa. No entanto, perante o colapso dos canais de atendimento ao cliente, a OCU assumiu o desafio e levou o caso às instâncias oficiais. 

Mas a organização vai mais longe. Considera que não se trata apenas de atrasos, mas de uma prática sistemática de retenção de dinheiro dos clientes sem qualquer contrapartida, o que pode constituir uma burla. Muitos clientes efectuam compras importantes, o que agrava a situação quando a empresa não responde. A OCU salientou que, se a AllZone estiver a atravessar dificuldades financeiras, poderá estar a atrasar os reembolsos para reter fundos dos clientes e manter-se artificialmente em funcionamento.

Uma sanção que pode atingir oito vezes o lucro ilícito obtido

A OCU solicitou às autoridades competentes em matéria de consumo um controlo formal e a aplicação de sanções pecuniárias proporcionais ao lucro ilícito obtido. Se as irregularidades forem confirmadas como “muito graves”, as coimas poderão atingir oito vezes esse lucro.

Queixas contra AllZone / OCU

A organização revela ainda que, em fevereiro de 2024, foram registadas apenas 22 queixas. Em agosto, passaram para 130, em setembro para 267 e em fevereiro de 2025 para 440. Ao mesmo tempo, a reação do AllZone foi cerrar fileiras. Um recuo que alimenta a desconfiança e deixa milhares de consumidores no limbo.

Sem resposta, os consumidores recorrem à via judicial

Para muitos afectados, a única saída é legal. A OCU aconselha recolher toda a documentação disponível (facturas, correios eletrónicos, capturas de ecrã) e ir aos tribunais. Para reclamações inferiores a 2.000 euros, o procedimento judicial pode realizar-se sem advogado nem procurador, uma via rápida e económica para reclamar. Ademais, a partir de abril de 2025, os consumidores poderão recuperar os custos legais se demonstraram ter tentado resolver o conflito de forma amistosa.

Enquanto aguardam a atuação das autoridades, milhares de clientes, entre a incerteza e a indignação, continuam à espera de respostas que não chegam. Enquanto isso, a confiança no comércio eletrónico, motor imparável da economia contemporânea, sofre mais uma fissura. Uma fissura que, em casos como este, não se mede apenas em euros, mas na vulnerabilidade do consumidor.