Na semana 'horribilis' de Bankinter e EVO Banco: contas sequestradas e avalanche de queixas

A migração, que em teoria ia ser um processo singelo, tem provocado situações dantescas, como denunciam clientes que ainda não podem manejar seu dinheiro com normalidade

Dos personas pasan delante de una oficina de Bankinter
Dos personas pasan delante de una oficina de Bankinter

Quando se fala de aproveitar sinergias, os alarmes de algumas pessoas se disparam. Esta frase pode evocar reestruturações que implicam despedimentos de pessoal, mudanças a pior na cultura empresarial, centralização de funções ou, directamente, perda da autonomia e da eficiência em aras da rentabilidade. Aproveitar sinergias era, precisamente, o que Bankinter procurava com a absorção de EVO Banco, um processo de integração que se disse que seria singelo, mas que tem terminado resultando traumático para alguns clientes.

Cristóbal Tenas é um deles. "Após mandar-nos vários correios durante as semanas prévias à mudança, dizendo-nos que não teríamos que fazer nada para além de conseguir umas chaves e nos cadastrar na app, nos informaram que do 11 ao 14 de julho não poderíamos aceder a nossas contas, nem desde a app de EVO nem Bankinter", conta a este meio. Todo o demais, isto é, o relativo aos pagamentos com cartões, funcionaria a priori com normalidade.

Dificuldades para pagar

No entanto, no domingo 13 de julho este consumidor começou a ter problemas com pagamentos em comércios, tanto em gasolineras como estabelecimentos de restauração e supermercados.

Mais adiante, na segunda-feira, já conseguiu aceder à app de EVO. "E começamos a ver as mudanças. O cartão de débito/crédito de EVO converteu-se-nos em crédito directamente, com um limite preestablecido, imposibilitando pagar a débito (que é a maneira na que eu pagamento)", detalha Tenas.

Oficinas de EVO
Escritórios de EVO / EUROPA PRESS

Sem respostas da empresa

Entre a terça-feira 15 e na quinta-feira 17, tentou chamou por telefone reiteradamente para tratar de contactar com a entidade bancária. Não o conseguiu. Ademais, Tenas foi a um escritório em Madri, onde "se limitaram a confirmar que os canais de comunicação estavam saturados", recorda. Não foi o único: durante esses dias, enquanto a inquietude cundía, os comentários críticos em redes sociais mencionando a EVO e Bankinter dispararam-se.

Por exemplo, um internauta publicou em X que tinha visto coisas "chungas", "mas a migração de EVObanco a Bankinter está a ser uma das experiências mais bochornosas que me tocou sofrer. E o pior de tudo é que quando por fim te atendem dão a sensação de que nem sabem por onde lhes dá o ar". Outra antiga cliente de EVO denunciou na quinta-feira 17 que levava seis dias sem poder aceder a suas contas, e tinha chamado até em 8 ocasiões. "Em todas me acabais pendurando vocês aos 20 min porque não tendes operadores. É vergonzoso, pretendeis que fiquemos em Bankinter?", perguntava-se.

Impago de quotas

Não se tratou (se é que se pode falar em passado) só de pequenas moléstias e incomunicação. "Na quinta-feira, uma das financeiras com as que opero para a compra de um carro me escreveu pelo impago da quota", relata Tenas. Nesse momento, começou a suspeitar que a migração das domiciliaciones não se tinha feito correctamente.

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Uma pessoa fala por telefone / PEXELS

"E minha preocupação não é tanto com as empresas privadas de serviços, como com a tesorería, Fazenda ou a Segurança Social. Sou autónomo e tenho domiciliados impostos como IVA, devoluções de modelo 100, pagamento da quota…", explica.

Má atenção ao cliente

Por se não a situação não fora suficientemente angustiosa, na quinta-feira 17 pela tarde, um trabalhador de Bankinter chamou a Tenas e tratou de lhe explicar a situação... sem sucesso. "Estava mais perdido que eu, não sabia contestar às coisas nem me dar uma solução", relata. Finalmente, na sexta-feira pela manhã falou com outro trabalhador e sim pôde obter respostas e soluções.

"Disseram-me que o da financeira que falhou tem sido um erro pontual, ao igual que o não poder pagar com os cartões durante alguns dias. Hoje tenho realizado dois pagamentos e tenho podido fazê-los sem problema", agrega. Com tudo, Tenas prefere manter em "a dúvida" até verificar que tudo vai como disseram que iria e como corresponde a um banco sério: como a seda.

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Uma escritórios de Bankinter / BANKINTER

"Um choque"

"Aparecer na app de Bankinter" ao vir de uma banca gerida integralmente on-line, diz Tenas, tem sido "um choque". "Funcionam com cartão de coordenadas, a app poderia ser mais clara, não existe um buscador…", lista.

Ainda que trata de mostrar-se comprensivo, conta situações dantescas: "Entendo o trabalho que pode chegar a supor uma mudança tão importante com milhares de utentes, mas o verdadeiro é que temos passado de que 'não nos íamos inteirar' a ter que chamar a familiares para que viessem a uma gasolinera porque não me deixavam marchar se não pagava".

Incidências absurdas

Apesar de que a situação particular de Tenas está mais ou menos encauzada, nesta sexta-feira 18 pela tarde, alguns destes problemas persistiam. "Só tenho voltado para dizer que a migração de EVO Banco a Bankinter tem sido o pior. Milhares de incidências absurdas e um SAC saturado que não podem atender reclamações. E têm os ovos de dizer em nota de imprensa que tem sido todo perfeito", criticava um utente.

La consejera delegada de Bankinter, Gloria Ortiz, durante una rueda de prensa
A conselheira delegada de Bankinter, Glória Ortiz, durante uma roda de imprensa / EP - DIEGO RADAMÉS

Só umas horas dantes, outro assegurava que sua nómina tinha estado "sequestrada quatro dias", depois do qual o banco a tinha devolvido à empresa porque o IAM não coincidia. "Graças por esta semana cheia de sobresaltos".

Os problemas persistem

Outros clientes falam de "sistemas defasados" ou de "atenção lamentável; e há quem assegura que certa documentação se tem evaporado pelo caminho. Também há espaço para a ironía: na própria sexta-feira 18, um utente pedia perdão ao banco "por queixar-me por não poder fazer transferências nem entrar a gerir MEU PUTO dinheiro".

"Quinto dia consecutivo sem poder aceder a meu dinheiro em Bankinter. Meu RG segue sem aparecer no banco de dados de atenção telefónica. Sem descobertos, dívidas de nenhum tipo, simplesmente porque têm comprado meu banco. Não se pode fazer pior uma migração", corroboraba outro tuitero, desesperado.

Una persona mira su móvil (3)
Uma pessoa olha seu móvel / PEXELS

Bankinter diz que não há falhas generalizadas

Este meio tem contactado com o banco para recolher seu ponto de vista e perguntar como podem se ter produzido tantísimas incidências. Desde a entidade tiram ferro ao assunto e defendem que "em absoluto há saldos bloqueados" nem "falhas generalizadas nem falhas graves, já que as incidências pontuas se estão solventando".

A grande maioria dos clientes, dezenas de milhares, considera Bankinter, "está a operar com normalidade". Neste complexo processo de "trasvasar um banco completo dentro de outros com mais de 440.000 clientes", admitem, sim há "algumas necessidades de ajuda por parte dos clientes e se lhes está atendendo". Utilizam, conscientemente, o presente.

"Casuística diversa"

O facto de ter que chamar a um familiar porque não é possível pagar numa gasolinera se antoja algo bem mais grave que uma "necessidade de ajuda", que soa bastante etéreo. Ademais, surpreende que, a perguntas deste meio, Bankinter fale de casos concretos nos que "os clientes não conseguem completar o alta por uma casuística diversa e o banco lhes está a ajudar a isso, mas o processo funciona perfeitamente".

Un edificio de Bankinter
Um edifício de Bankinter / BANKINTER

Têm a ousadia, inclusive, de jogar a culpa a alguns utentes, ao afirmar que a alguns "se lhes bloqueiam as chaves por esquecimentos de senha quando se cadastraram previamente (processo que levava aberto dois meses dantes da migração) ou directamente no alta posterior que se abriu na passada segunda-feira".

Coordenadas virtuais

Com respeito às polémicas coordenadas, arguyen que "aos clientes se lhes tem fornecido cartões de coordenadas virtuais que podem consultar. O cartão de coordenadas é um elemento adicional de segurança, necessário para reforçá-la".

"O envio do cartão de coordenadas aos clientes de EVO, que também têm todos os clientes de Bankinter, se faz em benefício do cliente. Os clientes têm sido informados com suficiente antelación sobre a necessidade de descarregar dita cartão de coordenadas, algo que já têm feito em sua imensa maioria. Qualquer cliente pode descarregá-la se não o fez, voltar à descarregar se não sabe onde a guardou, ou a solicitar fisicamente num escritório", agregam.

Benefícios

Convém recordar que, no primeiro trimestre de 2025, Bankinter atingiu um benefício de 270 milhões de euros, um 35% mais que no exercício anterior, com um "notável impulso do negócio".

Ademais, fechou o exercício 2024 com um benefício recorde de 953 milhões de euros, um 13% mais que em 2023, com melhoras em todas as margens da conta.