Adoptar um estilo de vida saudável melhora a saúde, ainda que não baixes de peso
Um estudo recente demonstrou que a melhoria dos hábitos de vida a longo prazo pode traduzir-se em benefícios para a saúde, mesmo quando não se perde peso. Porque é que ainda medimos o sucesso apenas em quilos?

Durante muitos anos, e ainda hoje, tomámos como óbvio o conselho médico de que, para melhorar a saúde cardiovascular, é necessário perder peso. Um novo estudo da Harvard School of Public Health não nega a validade deste conselho, mas qualifica-o de uma forma importante: mesmo que o peso quase não diminua ou até aumente, ,a mudança sustentada nos hábitos de vida sempre é benéfico.
Perde maus hábitos e ganha saúde
Embora a obsessão pela perda de peso tenha colonizado a nossa compreensão da saúde, este trabalho —publicado no European Journal of Preventive Cardiology— centra-se nos hábitos. Uma perspetiva que, embora muitas vezes esquecida, tem uma longa tradição. Para o efeito, analisaram os dados de mais de 760 pessoas com obesidade abdominal que participaram em três ensaios clínicos de longa duração (18 a 24 meses). E a conclusão foi clara: embora apenas uma fração dos participantes tenha conseguido uma perda de peso significativa (36%), a grande maioria melhorou em valores analíticos fundamentais, como o chamado “colesterol bom” (HDL), a gordura no fígado, a sensibilidade à insulina ou os valores da pressão arterial. Por outras palavras, embora em alguns casos a balança não tenha mexido muito, o metabolismo de todos os participantes respondeu positivamente.
Do estereotipo da imagem à saúde
Os resultados deste estudo convidam a que repensemos a forma com que avaliamos o sucesso dos programas de emagrecimento, ainda que a título pessoal, o confesso, o vejo uma utopia. Seja como for, faz sentido falar de "falhanço" nas estratégias de melhoria dos hábitos de vida quando alguém não baixa de peso, mas sim melhora o seu prognóstico de saúde? A resposta é um "não" rotundo, como demonstrou este estudo. Todas as pessoas com excesso de peso ou obsedidade que adoptaram mudanças no estilo de vida melhoraram os seus indicadores de saúde, independentemente da perda de peso. A tónica, como já foi dito tantas vezes, deve ser colocada na saúde e não no tamanho das saias ou das calças.
Para além das implicações diretas para as pessoas afectadas, esta mudança de perspetiva tem outras consequências importantes. Por um lado, ajudaria a combater o estigma associado às pessoas que não conseguem perder peso, frequentemente tratadas como “preguiçosas” ou “incapazes”. Por outro lado, reforça o valor das intervenções baseadas em hábitos sustentáveis em vez de soluções milagrosas de curto prazo baseadas apenas na balança.
É possível identificar as pessoas que são refractárias à perda de peso?
Não falo de ser refratário a uma (má) dieta e a um (mau) planeamento da atividade física. A isso, receio, todos são refractários. Refiro-me ao facto comprovado de fazer as coisas bem, ou pelo menos tão bem como outra pessoa, e não conseguir reduzir os quilos na balança (e outras pessoas conseguem).
Este estudo oferece também uma perspetiva encorajadora sobre a razão pela qual algumas pessoas têm tanta dificuldade em perder peso, apesar de estarem bem e, como já foi referido, terem feito melhorias metabólicas.
Assim, uma das descobertas mais surpreendentes situa-se no domínio da epigenética. Depois de analisarem as amostras de sangue dos participantes, os investigadores identificaram 12 locais específicos do ADN cuja metilação (uma modificação química que influencia a forma como os genes são expressos) parecia prever se uma pessoa responderia melhor ou pior às mudanças de estilo de vida em termos de perda de peso. Embora seja ainda demasiado cedo para fazer deste marcador uma ferramenta clínica de rotina, abre uma porta para uma medicina mais personalizada. Talvez dentro de alguns anos sejamos capazes de saber antecipadamente se uma pessoa tem mais probabilidades de perder peso melhorando a sua dieta e o seu padrão de atividade física, ou se necessitará de abordagens adicionais.
Entretanto, já sabemos: independentemente do que a balança mostre, fazer as coisas certas quando se trata de hábitos de vida é intrinsecamente positivo... e mensurável.