Carlos Hernández, sous chef de ABaC: "O cliente tem que entender que não só vem a comer"
O segundo chefe de cozinha do restaurante capitaneado por Jordi Cruz desvela quais são as chaves de um três estrelas Michelin

Depois de seu passo por templos gastronómicos como O Celler de Can Rocha ou o Cenador de Amós, Carlos Hernández é o atual sous chef do três estrelas Michelin ABaC. Para além de cozinhar, coordena, afina e executa com precisão milimétrica a cada plato que sai de uma das cozinhas de Jordi Cruz.
Consumidor Global tem entrevistado a Hernández durante a final dos Asian Culinary Awards 2025, celebrada em Barcelona. Um certamen que o jovem chef conquistou na edição anterior. Durante a conversa, Hernández explica quais são as exigências de um restaurante de alta cozinha, como se cria um plato que aspira à perfección e daí se cuece, literalmente, nos fogones de um lugar onde a cada serviço é um exame.
--Que é o mais importante para estar à frente de uma equipa e de uns fogones como os de ABaC?
--A chave é saber trabalhar em equipa. Há diferentes personalidades e se tens que as controlar, tens de ter mano direita e mão esquerda. Tens que liderar mais que fazer de chefe para que te sigam quanto a protocolos e maneiras de trabalhar.
--Como tem influído em seu estilo culinario atual seu passo por restaurantes como O Celler de Can Rocha?
--Uma percentagem elevada de onde estou na actualidade tem que ver com ter calcado essas cozinhas. Também estive no Cenador de Amós e te curtes quanto ao devir da gastronomia que queres fazer. Já sabemos o que exige a guia Michelin, que há detrás, o esforço que lhe tens de dedicar, horas, metodologia, precisão… A raiz disso, me preparei para poder estar onde tenho a sorte de estar actualmente.
--Para um cocinero, a prática é mais importante que a teoria, não?
--A cada casa trabalhará de sua maneira, tens que te adequar à cada restaurante. [No Celler de Can Rocha] estive oito meses de práticas e já te dá tempo a introduzir em sua maneira de fazer. Quanto mais tempo, mais prática tens para desempenhar-te dentro dessas cozinhas, que são complicadas.
--Que exige um três estrelas Michelin como ABaC?
--A palavra que o resume tudo é metodologia, tanto para limpar como para ser ordenado, pulcro, cozinhar, etcétera. Precisas uma metodologia adequada a esse restaurante, no que tem que ser todo perfeito, milimetrado.
--Acha que o comensal valoriza esta parte?
--Pode-o intuir pela apresentação dos platos, vê que há precisão, mas obviamente a grande maioria de coisas não se percebem. Detrás há muitas horas, tensões, discussões, alegrias…
--A inovação é um requisito indispensável, não?
--Três estrelas Michelin, duas, uma ou nenhuma… A cada um sempre procura até onde pode chegar. Aparece a inovação ao dizer 'a partir disto, que posso fazer novo?' Neste tipo de restaurantes a cada ano tens-te que superar. Se não o fazes, podes retroceder e esse é o nervosismo.
--Como é o processo de criação de um plato?
--O mais importante é partir da matéria prima. Conhecer onde se obtém o produto: se é marisco ou pescado, onde se pesca; ou se é carne, de que se alimentou o animal. Partes disto, vais fazendo uma árvore e vão surgindo as possíveis combinações. Mas também existe a outra partida, que é 'imaginación ao poder' sobre coisas que igual não combinarias nunca.
--A alta cozinha vê-se como algo inaccesible porque tem um preço que não está alcance de todo mundo. Está justificado?
--É um preço elevado, mas não porque sim. Detrás está o pessoal que trabalha no restaurante e as horas que dedica. A mão de obra não se vê, a tens que explicar ao cliente ou o cliente tem que entender que, nestes lugares, não só vai comer. Desfruta da experiência e a experiência implica que há muita gente detrás trabalhando, que em sala pode ter três pessoas para um comensal e, sobretudo, que o produto que se usa para elaborar os platos é de primeira qualidade.
--É uma experiência apta para todos os paladares?
--É para todo o público. Terá gente que é mais gourmet ou sibarita ou foodie que entenderá mais o que há por trás da cada elaboração, da cada molho, da cada guarnición. A cada paladar é um mundou.
--Que não deve faltar num menu para conquistar ao comensal?
--O trato, coisas que não são tangíveis. O ambiente que se gera nestes restaurantes tem que ser muito fluído.
--Trufas, wagyu… são ingredientes muito de moda nos últimos tempos. Os consumidores estão mais educados a nível gastronómico ou deixa-se levar por estas tendências?
--Esses ingredientes têm nome e são como o abecé, isto é, seguro que são produtos top. Mas está o saber fazer, tratar o produto. Se trata-lo bem e o executas com respeito, o realças. Aí é quando o comensal se pode dar conta de que de um produto não tão conhecido ou de menos renome, também é dos tops.