A Justiça permite a Ryanair e Norwegian seguir cobrando pela mala de mão

O pulso entre o Governo e as companhias aéreas livra-se agora também em Bruxelas, onde se debate uma reforma européia que poderia blindar a cobrança pela mala de cabine

O diretor executivo da Ryanair, Michael O'Leary, durante uma conferência de imprensa da Ryanair / EUROPA PRESS - EDUARDO PARRA
O diretor executivo da Ryanair, Michael O'Leary, durante uma conferência de imprensa da Ryanair / EUROPA PRESS - EDUARDO PARRA

A batalha legal entre o Ministério de Consumo e várias aerolíneas pela controvertida cobrança da bagagem de mão tem atingido um novo ponto álgido. O Tribunal Superior de Justiça de Madri (TSJM) tem aceitado as medidas cautelares solicitadas por Ryanair e Norwegian para suspender temporariamente as sanções impostas pelo Governo, permitindo a ambas companhias continuar cobrando a seus passageiros por subir a mala a cabine enquanto se resolve o fundo do litigio.

A decisão judicial, adoptada pela Sala do Contencioso-Administrativo, implica a suspensão de uma sanção de quase 108 milhões de euros no caso de Ryanair e de 1,6 milhões para Norwegian. A mudança, o tribunal tem exigido a ambas aerolíneas a apresentação de avais bancários equivalentes ao custo das multas mais os interesses legais: 110 milhões para Ryanair e 1,8 milhões para Norwegian. Contra este auto cabe ainda recurso de reposição num prazo de cinco dias.

Uma suspensão esperada

Desde o sector aéreo valoriza-se como positiva esta decisão, ainda que se reconhece que se trata de um passo cautelar. A Associação de Linhas Aéreas (ASA), que agrupa às principais companhias do sector, confia em que o TSJM adopte medidas similares com respeito às outras aerolíneas multadas: Vueling (39,3 milhões), EasyJet (29,1 milhões) e Volotea (1,2 milhões). Todas elas foram sancionadas em novembro do ano passado pela Direcção Geral de Consumo por considerar abusiva a política de cobrança pela bagagem de mão.

Dos personas esperan sentarse en asientos juntos en un avión de Ryanair / RICARDO RUBIO - EP
Duas pessoas esperam sentar-se em assentos juntos num avión de Ryanair / RICARDO LOIRO - EP

O tribunal madrileno tem considerado que, dada a elevada quantia das sanções, é apropriada as suspender até que se dite sentença definitiva, ao mesmo tempo em que sublinha que ainda não se entrou a valorizar o fundo do assunto. Isto permite às aerolíneas manter sua atual política comercial sem mudanças, ao menos até que se resolva o litigio de forma definitiva.

Choque frontal com o Governo

O confronto entre o sector aéreo e o Ministério de Consumo tem ido em aumento. O titular da carteira, Pablo Bustinduy, tem fazer# questão de que a cobrança pela bagagem de mão é "ilegal" e tem qualificado a suspensão cautelar como "uma medida previsível num Estado de direito". No entanto, desde Ryanair não têm duvidado em redoblar a pressão. Seu conselheiro delegado, Michael Ou'Leary, tem aproveitado a resolução judicial para carregar novamente contra o ministro.

"Dado o atual clima político em Espanha, o ministro Bustinduy tem assuntos bem mais urgentes que atender que interferir nas viagens aéreas de baixo custo, uma indústria vital para a economia espanhola", tem declarado o diretor num comunicado oficial. Ou'Leary já protagonizou semanas atrás uma polémica campanha burlando do ministro, num tom que tem crispado ainda mais as relações entre o Governo e a low cost irlandesa.

O pulso translada-se a Bruxelas

Para além dos tribunais espanhóis, o conflito poderia dirimirse proximamente nas instituições européias. Neste mês, o Conselho da União Européia tem dado luz verde a uma proposta de reforma do Regulamento de Direitos dos Passageiros, que contempla expressamente a possibilidade de que as aerolíneas cobrem por transportar em cabine a bagagem conhecida como "trolley".

A reforma ainda deve ser ratificada pelo Parlamento Europeu, mas já tem sido interpretada pela patronal ASA como um respaldo ao modelo de negócio baseado na desagregação de serviços. O novo regulamento estabeleceria, ademais, que todas as aerolíneas deverão aceitar sem custo adicional uma peça mínima de bagagem de 40x30x15 centímetros, o que, segundo o sector, contribuirá segurança jurídica e reduzirá a litigiosidad.

Um modelo em entredicho

Desde o Ministério de Consumo, no entanto, têm anunciado que brigarão por introduzir emendas que reforcem a protecção ao consumidor. Se a sanção às aerolíneas prosperasse, Espanha converter-se-ia no primeiro país da União Européia em proibir esta prática tarifaria, o que tem acendido os alarmes num sector que defende a liberdade comercial como pedra angular de seu modelo de baixo custo.

O desvincule deste caso poderia ter profundos envolvimentos para o futuro do transporte aéreo em Europa. A cobrança pela mala de mão, convertido em símbolo do modelo low cost, revelou-se como um assunto finque tanto para as companhias como para os organismos reguladores. Enquanto o TSJM delibera e Bruxelas perfila o novo marco normativo, os passageiros seguirão, por agora, pagando por levar sua mala em cabine.