O 'impuestazo' ao fumo ameaça com disparar seu preço (e cobrir a maior despesa em defesa)
Bruxelas propõe uma subida histórica promotora sobre produtos tabaqueros como fonte direta de financiamento para enfrentar novas prioridades geopolíticas, como o reforço da despesa militar

A União Européia está a explorar novas vias de financiamento para cobrir o incremento da despesa orçamental provocado pela instabilidade geopolítica atual. Entre as prioridades que pressionam as contas comunitárias destaca o reforço do investimento em defesa. E no meio deste debate, um produto volta a colocar no ponto de olha promotor: o fumo.
Segundo uma filtragem procedente do Escritório de Enlace de Assuntos Internacionais de Alemanha em Bruxelas, à que tem tido acesso o Parlamento germano, a Comissão Européia baralha impor novos impostos específicos a produtos de consumo como o fumo e os resíduos eletrónicos. O objectivo é gerar rendimentos adicionais que complementem as fontes primárias atuais, como as contribuições nacionais ou os direitos de aduanas.
Tem acendido os alarmes
A proposta encaixa com informações recentes publicadas pelo portal especializado Euractiv, que apontam a que o comissário europeu de Acção Climática, Wopke Hoekstra, tem estado promovendo activamente uma subida de impostos ao fumo como fórmula para fortalecer o orçamento da UE, evitando assim carregar ainda mais o Sistema de Comércio de Emissões (ETS).

Hoekstra, exministro de Finanças de Países Baixos, estaria a liderar uma ofensiva promotora que já tem acendido os alarmes em vários Estados membros.
Subida histórica de 139%
A reforma articular-se-ia através de uma revisão profunda da Diretora sobre os Impostos Especiais do Fumo (TED), um marco que regula a fiscalidad mínima que devem aplicar os países europeus. A proposta inclui um aumento histórico de 139% no imposto mínimo aplicável aos cigarros, uma medida que somar-se-ia aos encargos nacionais existentes, já sejam taxas especiais ou o IVA.
Ainda que até agora não se tinha aclarado se esta subida repercutiria directamente no orçamento central de Bruxelas ou se os Estados membros reteriam uma parte significativa destes rendimentos, a filtragem alemã desocupa a incógnita: a Comissão Européia quer que esta arrecadação alimente directamente as arcas comunitárias.
Rejeição desde Suécia
A resposta não se fez esperar. A ministra de Finanças de Suécia, Elisabeth Svantesson, reagiu com dureza em redes sociais. Numa mensagem publicada recentemente em sua conta de X (dantes Twitter), qualificou a proposta de "inaceitável" e afirmou que é óbvio que os rendimentos fiscais devem beneficiar a Suécia e não ir parar à burocracia da UE".
A oposição sueca põe de relevo uma tensão crescente entre a lógica integradora de Bruxelas e a defesa da soberania fiscal por parte de alguns Estados membros. De facto, vários governos temem que este tipo de iniciativas fiscais comuns sentem um precedente que erosione seu controle sobre a arrecadação nacional.
Quem paga a factura?
Para além da pugna política, a grande incógnita para milhões de europeus é como afectar-lhes-á esta medida no bolso. Com um aumento de 139% nos impostos especiais ao fumo, o preço dos cigarros –que já supera os 10 euros por carteira em países como França ou Irlanda– poderia se disparar ainda mais em toda a União Européia.
Este encarecimiento, além de ter um potencial efeito disuasorio no consumo (uma das justificativas históricas deste tipo de impostos), poderia aumentar a pressão sobre os consumidores e, eventualmente, incentivar compra-a ilegal ou o contrabando, fenómenos que já preocupam em alguns mercados do este e sul de Europa.
Um financiamento polémico
A medida se enmarca num debate mais amplo sobre como deve se financiar a UE num contexto de crescentes desafios globais, como a guerra em Ucrânia, a transição energética ou a digitalização. Em frente ao dilema de aumentar as contribuições estatais ou procurar fontes próprias de rendimentos, Bruxelas parece apostar pela segunda via.

No entanto, vincular directamente estes rendimentos a partidas sensíveis como a defesa gera inquietude. É legítimo que os consumidores –neste caso, os fumadores– financiem o rearme europeu? Não deveria este esforço se distribuir de forma mais equitativa entre os cidadãos e os Estados? Por agora, a proposta segue em fase de estudo, mas o debate já tem começado.